O Grande Conflito em Nossa Vida:

"Quanto ao mais, sede fortalecidos no Senhor e na força do seu poder. Revesti-vos de toda a armadura de Deus, para poderdes ficar firmes contra as ciladas do diabo; porque a nossa luta não é contra o sangue e a carne, e sim contra os principados e potestades, contra os dominadores deste mundo tenebroso, contra as forças espirituais do mal, nas regiões celestes. Portanto, tomai toda a armadura de Deus, para que possais resistir no dia mau e, depois de terdes vencido tudo, permanecer inabaláveis. Estai, pois, firmes, cingindo-vos com a verdade e vestindo-vos da couraça da justiça. Calçai os pés com a preparação do evangelho da paz; embraçando sempre o escudo da fé, com o qual podereis apagar todos os dardos inflamados do Maligno. Tomai também o capacete da salvação e a espada do Espírito, que é a Palavra de Deus; com toda oração e súplica, orando em todo tempo no Espírito e para isto vigiando com toda perseverança e súplica por todos os santos e também por mim [...]." Efésios 6:10-19

terça-feira, 23 de julho de 2019

4º Capítulo: Ex Pastor da IASD Conta Tudo! Período: Adolescência e Juventude - Dos 16 Anos aos 19 Anos de Vida - Bíblia, Colportagem e IASD

O que estou relatando aqui é minha experiência de vida no sentido espiritual, dividido em blocos, por períodos ou fases que passei em minha vida e trajetória cristã. Este próximo período, que vai dos 16 anos aos 19 anos de vida foi um dos períodos mais significativos em minha experiência espiritual, pois foi justamente neste período que tomei decisões que afetaram diretamente o meu futuro como cristão. Até os 16 anos eu estava frequentando e participando ativamente da IEQ, sede de Lages, SC. Como relatei anteriormente, eu estava tão envolvido com as atividades da IEQ que almejava ser um obreiro e posteriormente um pastor, eu já sentia o chamado de Deus ainda na minha puberdade. Mas quase tudo que eu acreditava na IEQ estava prestes a sofrer um profundo impacto e mudança.

Tudo começou numa bela manhã ensolarada de sábado na cidade serrana de Lages, SC. Eu estava andando de bicicleta e louvando a Deus quando senti uma alegria indescritível dada pelo Espírito Santo. Senti uma vontade enorme de conhecer mais a Palavra de Deus. Senti fome e sede da Palavra de Deus. Lembro como se fosse hoje, olhei para aquele céu azul e ensolarado com nuvens brancas, e disse para o Senhor Jesus que eu estudaria mais a Sua Santa Palavra, que eu buscaria saber e conhecer cada vez mais sobre a Sua Santa Vontade. Quando cheguei em casa naquela manhã eu estava radiante, e logo fui perguntar para minha avó e para minha mãe como eu poderia estudar mais a Bíblia e aprender mais sobre a vontade de Deus por meio da Sua Palavra. Minha mãe respondeu que na Igreja Adventista do Sétimo Dia - IASD - eles davam cursos bíblicos gratuitos e estudavam muito a Bíblia. Foi então que decidi na mesma hora ir até lá, mas já era quase meio dia naquela manhã de sábado e minha mãe me disse que a Escola Sabatina começava as nove horas em ponto. Desse modo, eu teria que esperar até o próximo sábado. Naquela semana eu fiquei muito ansioso para ir na IASD central de Lages, SC, e pedir meu primeiro curso bíblico, eu mal podia esperar para começar a estudar melhor a Palavra de Deus.

Naquela semana continuei frequentando os cultos da IEQ normalmente, pois tinha reuniões quase todos os dias da semana e eu gostava de ir. Não falei nada para ninguém da minha igreja sobre minha intenção de fazer um curso bíblico da IASD, pois eu não pretendia mudar de religião e muito menos deixar de congregar com o grupo de jovens que tinha me dado tanto apoio espiritual e que eu mantinha profunda amizade cristã.

Quando o sábado chegou, acordei bem cedo, me arrumei para ir na IASD central de Lages, SC, para participar pela primeira vez de uma classe da escola sabatina, eu tinha 16 anos de idade, estava feliz porque finalmente iria estudar mais a Bíblia e conhecer melhor a vontade de Deus para minha vida. Eu não fui na IASD para mudar de religião, ou porque não gostasse da IEQ da qual era membro, mas para simplesmente solicitar um curso bíblico porque meu interesse era estudar mais a Palavra de Deus. Quando cheguei na igreja naquela manhã ainda era bem cedo, devia ser mais ou menos oito e meia, mas já tinha um grupo de pessoas estudando a Bíblia, era a classe dos professores, ainda não era a escola sabatina, mas eu não sabia disso. Achei estranho que tivesse tão pouca gente, eram mais ou menos umas dez pessoas. Estavam todas reunidas nos últimos bancos da igreja formando uma pequena classe de estudo bíblico, e havia um professor à frente do grupo coordenando os estudos. Lembro que estavam com um guia de estudos, que mais tarde fui saber que se tratava da "Lição da Escola Sabatina". O tema que estavam conversando era sobre o "Milênio", a princípio não entendi muita coisa e fiquei sentado em silêncio, apenas ouvindo. As pessoas ficavam me olhando curiosas e confesso que não me senti muito à vontade. Não me recordo de ter ficado até o final, saí antes, sem conversar com ninguém e não cheguei a ficar para o início da escola sabatina em si, a qual iniciava as nove horas. Enquanto voltava para casa a pé, decidi que nunca mais entraria naquela igreja, eu tinha feito um julgamento das pessoas com base na atitude delas para comigo, eu tinha achado aquelas pessoas muito frias e indiferentes, um comportamento bem alheio ao que eu vivenciava na igreja pentecostal a qual eu frequentava e era membro, na IEQ as pessoas eram mais fervorosas e acolhedoras.

Apesar dessa primeira visita "desastrosa" na IASD, o meu desejo de estudar mais a Palavra de Deus ardia em meu peito como um fogo divino. Quando cheguei em casa e contei para minha mãe e avó o que havia ocorrido lá na IASD, elas me disseram para eu não desanimar. Continuei orando e pedindo que o Espírito Santo me iluminasse e guiasse no que eu devia fazer. Passadas algumas semanas, decidi que tentaria pela última vez fazer uma visita na IASD e ia tentar conseguir um curso bíblico a todo custo, mesmo que fosse mal recebido.

Desta vez fui mais perto do horário da escola sabatina, as nove horas da manhã de sábado. Quando cheguei na igreja, haviam recepcionistas à porta, perguntaram meu nome, de onde eu era e pediram que eu assinasse um livro de visitas. Sentei mais à frente numa das classes da escola sabatina. O professor da classe, após fazer a chamada dos alunos perguntou quem era visitante e de onde era. Me identifiquei como membro da IEQ central de Lages, SC. Lembro de seu semblante sínico e preconceituoso e de seu comentário: "é uma igreja pentecostal?" Respondi que sim. Pela atitude dele e os olhares dos membros daquela classe, me senti um pouco discriminado. Mas eu estava decidido a permanecer até o final. Após o estudo da bíblia na classe da escola sabatina, houve um pequeno intervalo para alguns anúncios e em seguida houve a entrada da plataforma, ou seja, das pessoas que ficariam à frente no púlpito para dirigirem o culto de adoração. Lembro da solenidade do  momento, o que me chamou atenção foi o espírito de reverência e adoração que reinou na igreja. Naquela época, em 1983, o culto divino tinha uma liturgia muito solene e reverente. Após a entrada dos componentes da plataforma, os participantes da mesma se ajoelhavam enquanto a congregação permanecia em pé e em reverente silêncio. Todos que participavam da composição da plataforma ou púlpito tinham que usar terno e gravata, era proibido se vestir de qualquer jeito na presença de Deus. Isso tudo dava uma solenidade especial ao culto de adoração. Em seguida, o hino inicial de invocação era entoado e a oração de invocação era feita de maneira solene. Dízimos e ofertas eram arrecadados ao som de um hino e uma oração de consagração era feita. Após o hino congregacional se fazia uma oração pedindo a benção de Deus sobre o pregador. Tudo era muito diferente dos cultos da IEQ, e o modo solene e reverente daquele culto na IASD de Lages, SC, me deixou perplexo, e eu senti a presença de Jesus durante toda a cerimônia de louvor, adoração e pregação da Palavra de Deus naquela manhã de sábado. Quem fez o sermão no culto divino foi o pastor Santos Opazo. Chileno radicado no Brasil, o pastor Opazo tinha um sotaque inconfundível, com um legítimo "portunhol". Ele fez um sermão muito significativo e espiritual sobre o perdão e usou como referência o evangelho de João capítulo oito, fazendo menção ao Espírito de Profecia, e usando citações do livro "O Desejado de Todas as Nações" de Ellen G. White. Eu nunca havia escutado um sermão assim, com tanta profundidade espiritual. Confesso que fiquei encantado com a mensagem daquela manhã de sábado. A Palavra de Deus estava ardendo em meu coração. E como eu não via nenhuma manifestação de amém, glórias e aleluia por parte dos membros, eu também me calei, mas como todo bom pentecostal minha vontade era gritar bem alto: Glória a Deus!

A propósito, vou abrir um parênteses aqui para falar do pastor Santos Opazo. Muitos anos mais tarde pude reencontrá-lo como colega de ministério, e fui professor de Bíblia para suas filhas na Escola Adventista em Joinville, SC, e assim nos tornamos grandes amigos até hoje. O pastor Santos também mora atualmente (2021) em Joinville, SC, na mesma cidade em que moro também. Ele sempre demonstrou ser meu amigo, mesmo depois que fui obrigado a deixar o pastorado e fiquei fora da IASD por mais de 16 anos. Também me convidou para jantar na casa dele quando eu estava afastado da IASD, e depois que retornei para a IASD também. A propósito, sua esposa cozinha muito bem e é uma mulher de muita fé. Recordo também que o pastor Santos Opazo levava a lição da escola sabatina para mim em meu local de trabalho na CRE quando eu ainda estava afastado da IASD, e sempre dizia que estava orando por mim. Ele sabia como eu me sentia, pois ele também havia deixado o ministério pastoral da IASD, mas ele sempre foi um grande servo de Deus, a quem tenho uma dívida de gratidão pelo apoio espiritual que me deu.

Destarte, uma das coisas que me chamou mais atenção foi a reverência e a solenidade daquele culto sabático na igreja de Lages, SC, parecia que eu estava diante do trono do altíssimo, eu senti a presença de Jesus e a atuação do Espírito Santo de uma maneira totalmente diferente do que eu estava acostumado nos cultos da igreja pentecostal a qual eu participava, a IEQ. Na saída da igreja percebi que o pastor cumprimentava todos os membros, o que não acontecia na minha igreja. Após cumprimentar o pastor fiquei na frente da igreja esperando ele terminar de cumprimentar os membros para lhe pedir um curso bíblico. Foi então que um irmão se aproximou de mim perguntando meu nome e de onde eu era. Ele se apresentou como irmão Sebastião Souza. 

Ao conversar com o irmão Sebastião eu lhe disse de pronto que desejava fazer um curso bíblico, ao que ele prontamente se ofereceu para o levar até minha casa, e rapidamente pegou um caderno de anotações e anotou meu endereço dizendo que no início da tarde estaria na minha casa. Quando eu lhe disse que minha avó e minha mãe já tinha sido adventistas seu interesse aumentou, e ele me garantiu que iria me levar o curso bíblico na minha casa naquela tarde de sábado. Eu fiquei feliz porque finalmente iria começar a estudar mais a Palavra de Deus.

Quando cheguei em casa comuniquei minha avó e minha mãe que um irmão da Igreja Adventista do Sétimo Dia viria até nossa casa para trazer um curso bíblico para mim. Logo após o almoço ficamos aguardando a chegada do irmão Sebastião Souza, o que ocorreu após as 14 horas. Lembro que minha avó, meu avô, minha mãe e eu o recebemos muito bem, e logo a conversa começou a girar em torno da Bíblia. O irmão Sebastião era muito missionário e conhecia muito bem a Bíblia, sabia de cor vários textos e dominava muito bem os assuntos ao responder cada pergunta com o que estava escrito na Bíblia. Não demorou muito para entrar em temas polêmicos, mas ele sempre pedia para a gente abrir a Bíblia nos textos e ler em voz alta para ele. Percebi que eu não sabia nada, fiquei até meio constrangido e envergonhado porque como pentecostal fervoroso que eu era eu não sabia sequer um texto de cor, e muito menos sabia pesquisar os textos para achar as respostas conforme o que estava escrito na Palavra de Deus. Fiquei impressionado com o conhecimento bíblico do irmão Sebastião e com sua capacidade de memorizar os textos. Eu decidi a partir de então, que também queria ter mais a Palavra de Deus gravada em minha mente e em meu coração. Aquela primeira experiência em estudar a Bíblia com o irmão Sebastião me inspirou a ler mais a Bíblia e a decorar textos bíblicos. Eu achei lindo a maneira como aquele irmão usava e manejava a Palavra de Deus e o amor que tinha por ela, coisa que eu não tinha visto na minha igreja pentecostal. Após esse primeiro estudo com o irmão Sebastião, antes dele ir embora já no final daquela tarde de sábado, o mesmo prometeu que voltaria no sábado seguinte, o que me deixou surpreso, porque eu pensava que ele apenas ia me deixar o curso bíblico para eu fazer por conta própria. Após ele ir embora, minha avó e minha mãe também foram impactadas, eu podia sentir que elas estavam incomodadas com alguma coisa, mas eu não sabia o que era. Eu tinha 16 anos de idade quando isso ocorreu, e eu era membro da IEQ central de Lages, SC, e minha intenção não era mudar de religião, mas apenas conhecer mais a Bíblia.

Durante a semana eu continuei frequentando os cultos da minha igreja, a IEQ, mas algo tinha mudado em relação à Bíblia, eu estava lendo mais, meditando, pesquisando e estudando a Palavra de Deus, e isso estava me fazendo muito bem. No sábado seguinte eu não fui ao culto da IASD, mas à tarde fiquei esperando a visita do irmão Sebastião com certa ansiedade. Ele não tinha me deixado todo o curso bíblico, mas apenas a primeira lição, sendo assim eu queria muito continuar a estudar os temas bíblicos. Lembro que a primeira lição falava sobre a inspiração da Palavra de Deus. Quando o irmão Sebastião chegou ficamos mais uma tarde lendo e estudando a Bíblia, mas desta vez eu fiz alguns questionamentos sobre algumas declarações feitas por ele, ao que ele sempre respondeu com textos bíblicos. Um dos questionamentos foi em relação aos "Dez Mandamentos da Santa Lei de Deus". Quando o irmão Sebastião me disse e mostrou na Bíblia que o mandamento do sábado ainda estava vigente, eu fiquei impressionado, porque eu mesmo lia os textos bíblicos que ele indicava e eu me perguntava: mas como eu nunca li sobre isso na Bíblia?  Após ele ir embora, eu estava com muitos questionamentos em minha mente, e naquela semana decidi procurar o pastor da IEQ para que ele pudesse me ajudar a entender melhor algumas coisas. Quando questionei o pastor da minha igreja (IEQ) sobre o sábado do quarto mandamento, ele sorriu e me disse que era só para os Judeus. Disse ainda que o que importava era santificar um dia na semana para Deus, e que meu sábado seria o dia em que eu repousasse, e que estávamos debaixo da graça e não debaixo da Lei. Disse ainda que os discípulos de Jesus guardavam o domingo porque Jesus havia ressuscitado no primeiro dia da semana. Confesso que fiquei decepcionado com aquelas explicações, pois em nenhum momento o pastor abriu a Bíblia para me mostrar onde estava escrito tais argumentos. Decidi então que iria orar e estudar a Bíblia por conta própria, e pedir ao Espírito Santo para ser meu mestre e meu professor.

Nos sábados seguintes outros questionamentos surgiram em relação aquilo que eu acreditava na IEQ; Como por exemplo: a imortalidade da alma, os milagres, a santidade do domingo, o dom de línguas e qual era a igreja verdadeira. Diante das respostas dadas pelo irmão Sebastião Souza, eu confesso que comecei a odiar as visitas do irmão Sebastião, e meu comportamento e atitudes em relação a ele mudaram, pois eu estava ficando com dúvidas e confuso em relação ao que eu acreditava, mas ao mesmo tempo eu estava sendo convencido pela Palavra de Deus. Lembro que a gota d'água foi num sábado a tarde em que o irmão Sebastião afirmou que quem santificava o domingo estava com o sinal da Besta e não o sinal de Deus, e que os milagres da minha igreja eram operados por espíritos de demônios inclusive o dom de línguas, então eu me revoltei com ele. Lhe pedi para me deixar todas as lições do curso bíblico porque eu iria estudar por conta. Ele prontamente me deixou. No sábado seguinte, antes que ele chegasse à minha casa eu peguei minha bicicleta, minha Bíblia e o curso bíblico e fui para o estádio de futebol do Internacional de Lages para estudar a bíblia sozinho. Lembro que eu fiquei lá até o final da tarde daquele sábado, e quando eu voltei para minha casa tive o cuidado de verificar se o carro do irmão Sebastião ainda estava parado na frente dela, pois se tivesse eu não iria voltar, para não ter que conversar com ele e acabar discutindo. Fiz a mesma coisa pelos próximos sábados. Enquanto isso, eu orava pedindo uma revelação especial a Deus sobre qual era a igreja verdadeira. Lembro que cada tarde de sábado que eu passava nas arquibancadas vazias do estádio de futebol do Internacional de Lages, SC, junto com os passarinhos que ficavam cantando no gramado do campo, cada uma daquelas tardes teve um significado espiritual profundo em minha vida cristã, pois era apenas eu, a Palavra de Deus e o Espírito Santo a me iluminar. Eu sentia muito a presença de Jesus comigo enquanto estava lá sozinho, lendo, estudando e meditando nas verdades da Santa Palavra de Deus.

Foi o estudo da Bíblia e a prática da oração que causaram profundas mudanças em minhas convicções religiosas, a ponto de eu tomar a decisão de começar a santificar o sábado do quarto mandamento mesmo sendo membro da IEQ. Aos domingos de manhã eu ajudava na escola bíblica dominical, porém, como queria santificar o sábado conforme está escrito na Palavra de Deus, eu tive que tomar a decisão de frequentar também a escola sabatina na IASD Central de Lages, SC. Desta forma, aos sábados pela manhã eu ia na escola sabatina e aos domingos pela manhã eu ia na escola dominical. Fiz isso durante alguns finais de semana, e todas as vezes que fui na IASD eu não havia visto mais o irmão Sebastião. Ele também havia parado de ir até minha casa, pois nunca me encontrava lá. Cheguei a pensar que aquele irmão tinha desistido da fé, pois eu não o via mais. Todavia, num sábado à tarde ele apareceu na minha casa, o que foi motivo de alegria para mim. A primeira coisa que perguntei a ele foi se havia deixado de frequentar a igreja adventista, ao que ele me respondeu que não, e questionou o porquê da minha pergunta. Eu não sabia, mas ele havia "sumido" por um tempo porque estava envolvido num evangelismo num dos bairros da cidade onde ainda não havia igreja adventista. Ele foi um dos fundadores da futura IASD do Bairro Santa Helena em Lages, SC. Então lhe disse que eu estava frequentando a escola sabatina e que tinha me matriculado numa das classes. Ele ficou muito feliz com minha notícia. Mas quando eu lhe disse que ainda continuava na IEQ e que eu ajudava na escola dominical, ele me afirmou que eu não podia honrar o sinal da besta e guardar o sábado do Senhor ao mesmo tempo. Aquela afirmação me incomodou muito. Eu mesmo já tinha percebido que eu não poderia ficar naquela situação por muito tempo, e que eu precisaria tomar uma decisão radical em favor de um dos dois lados. Então comecei a orar fervorosamente a Deus por respostas.

Como um bom pentecostal que eu era, nas reuniões de oração na IEQ, e em casa no meu quarto, eu comecei a pedir um sinal para Deus, de qual era a igreja verdadeira, e quem ensinava as verdades da Palavra de Deus, a IEQ ou a IASD? Eu clamava ao Senhor Jesus por um milagre, por uma revelação divina por meio de um sonho ou de uma visão. Os dias passaram enquanto eu buscava uma resposta direta de Deus por meio do Espírito Santo, até que numa manhã minha mãe me disse que tinha tido um sonho muito estranho. Ela me contou que em seu sonho ela tinha visto várias igrejas de diferentes denominações, e que todas estavam pegando fogo, menos a Igreja Adventista do Sétimo Dia. Imediatamente pensei em duas interpretações: ou a IASD era a única que não tinha o Espírito Santo, pois o fogo na Bíblia é usado como um dos símbolos do Espírito de Deus, ou a IASD era a única que não estava debaixo da condenação de Deus, uma vez que o fogo na Bíblia também é usado para descrever o juízo divino. Orei a Deus para que me orientasse e me guiasse não mais por sonhos e visões, mas unicamente pela Sua Santa Palavra sob a luz do Espírito de Cristo.

O que se seguiu foi que eu continuei frequentando a IEQ onde tinha muitos irmãos e amigos, mas tomei a decisão de santificar o sábado do quarto mandamento, e por isso aos sábados eu frequentava a IASD. Minha luta foi para fazer a vontade de Deus revelada em Sua Santa Palavra. Porém, quando recebi um estudo bíblico sobre o dom profético dado a Ellen G. White as coisas ficaram muito mais complicadas e difíceis para mim. Eu estava numa angústia muito grande. Quando levei o novo conhecimento que estava adquirindo sobre o Espírito de Profecia para meus amigos e irmãos pentecostais, a primeira coisa que ouvi eles dizerem é que Ellen G. White era uma falsa profetiza. Mas eles nunca tinham lido nada escrito por ela, e quando fui falar com o pastor da IEQ, o pastor Pedro Antipas, ele me afirmou que se tratava de uma falsa profetiza. Como eu nunca tinha ouvido falar dela, e nunca tinha lido nada sobre ela, comecei a orar e pedir que o Espírito Santo me guiasse e iluminasse, pois se Ellen G. White de fato fosse uma falsa profetiza eu jamais pisaria dentro de uma Igreja Adventista do Sétimo Dia. Aconteceu que, orientado pela minha mãe e avó, eu descobri que dentro da nossa casa havia um livro de Ellen G. White, era um livro em formato de bolso intitulado: "Vereda Para Cristo", como mais tarde fiquei sabendo, esse livro também era chamado carinhosamente de "Veredinha". O livro estava guardado em uma gaveta, estava sem capa, mas com todas as páginas intactas. Comecei a ler avidamente, na expectativa de encontrar alguma heresia, uma vez que haviam me dito que Ellen G. White era uma falsa profetiza. Quando terminei de ler, eu estava me sentindo mais perto de Jesus e de Sua Palavra. Não me contentei e li novamente de capa a capa. Quando terminei, li novamente todo o livro por mais quatro vezes, somando um total de sete leituras completas do livro "Vereda Para Cristo", o qual hoje é intitulado de "Caminho a Cristo". Eu lia e orava, pedindo a benção de Deus. Não havia nada nesse livro de Ellen G. White que desqualificasse a Bíblia, não havia nenhuma heresia e muito menos nada que exaltasse Ellen G. White. Pelo contrário, o livro que hoje se chama "Caminho a Cristo", apenas exaltava a Palavra de Deus e o nome de Jesus como Salvador e Senhor. Na realidade o livro estava fundamentado na Palavra de Deus, e eu me sentia mais próximo do adorável Jesus. Cheguei a conclusão que Ellen G. White só poderia estar sob a inspiração do Espírito Santo para escrever o livro "Caminho a Cristo". Minhas dúvidas estavam sendo removidas uma a uma, e quanto mais eu estudava a Bíblia, quanto mais eu orava, quanto mais eu me aproximava de Jesus, mais certeza eu tinha que a IASD estava pregando o Evangelho Eterno.

O final do ano estava chegando, e com ele as férias escolares. Eu estava cursando o primeiro ano do ensino médio, o ano era 1982. Eu não estava indo muito bem na escola por conta de noites mal dormidas e enfrentamentos espirituais constantes com as forças das trevas. Acordava de madrugada ouvindo barulhos dentro de casa, estalos, meu corpo arrepiava e sentia a presença de espíritos malignos, além de sofrer algumas vezes com pesadelos que pareciam muito reais. Era uma luta espiritual intensa nas madrugadas. Lembro que quando eu era acordado na madrugada pelos espíritos de demônios, isso ocorria quase sempre no mesmo horário, eu tinha o costume de abrir a janela que ficava em cima da minha caminha de solteiro no meu pequeno quarto, daí me ajoelha sobre a cama, colocava as mãos postas sobre o parapeito da janela, olhava para o céu estrelado, mesmo no inverno rigoroso de Lages, SC, e então clamava a Deus em nome de Jesus pedindo a presença dos anjos celestiais e a proteção divina. Eu também costumava recitar o Salmo 91 como uma oração. Apesar de sentir a presença do mal literalmente, Jesus nunca me deixou sozinho, Ele sempre esteve ao meu lado e sempre ouviu e atendeu minhas súplicas por libertação. Na grande maioria das vezes, a resposta às minhas orações suplicando livramento ocorria na mesma hora em que eu acabava de orar e dizia amém.

Um determinado sábado a tarde, quando eu já estava de férias, no mês de dezembro de 1982, fui surpreendido com a visita do irmão Sebastião Souza e mais dois homens que vieram com ele. Um deles era pastor ou estava estudando para ser um pastor da IASD, não me recordo muito bem, e o outro era um Colportor Evangelista. Infelizmente não recordo o nome deles. Eles me disseram que naquele momento em minha cidade tinha um grupo de jovens colportores que eram estudantes como eu. A princípio fiquei sem entender nada, pois nunca tinha ouvido a palavra "colportores" e não fazia ideia do que se tratava. Eles então me explicaram o que era a Colportagem Evangelística da IASD, e que esse trabalho tinha o apoio institucional da Igreja Adventista do Sétimo Dia, além de uma clara orientação profética dada por Deus por meio de Ellen G. White sobre a obra da colportagem, chamada por ela mesma como: "A Obra Daquele Outro Anjo". Esse grupo de jovens eram estudantes do Sistema de Educação Adventista e que tinham vindo de vários Internatos Adventistas espalhados pelo Brasil. Os estudantes saiam nas férias para vender livros de porta em porta para pagar os seus estudos com o lucro de suas vendas. Eles também ganhavam um bônus em forma de bolsa de estudos que a editora da IASD, a Casa Publicadora Brasileira, concedia para aqueles estudantes que conseguiam atingir uma determinada meta de vendas. Explicaram também que os livros eram fornecidos em consignação, de maneira que o investimento dos colportores estudantes era zero, tendo apenas que trabalhar muito para vender os livros e conseguir o estipêndio escolar.

Aqueles homens de Deus perguntaram se eu tinha interesse em participar. Como eu estava de férias e me interessei bastante, de pronto aceitei o convite. Era uma experiência nova para mim. Fiquei empolgado com a ideia de poder levar a Palavra de Deus de porta em porta, além de ganhar algum dinheiro nas férias. Eu estava ansioso e curioso para iniciar logo. Eles me deram o endereço onde a equipe de colportores estudantes composta por cerca de vinte jovens estava alojada. Decidi de imediato que ficaria junto com eles no mesmo alojamento e não na minha casa. Logo no domingo fiz minha "mudança" com uma mala de roupas e roupas de cama. Tive o total apoio da minha mãe Miriam e da minha avó Osvaldina. Logo na minha chegada fui bem recebido pelos jovens estudantes e não demorou muito para eu me enturmar e fazer novas amizades. O local ficava no centro da cidade de Lages, e minha família não se opôs que eu ficasse junto com eles durante as minhas férias, que naquela época eram no mês de Dezembro, Janeiro e Fevereiro, pois as aulas só começavam em Março. 

Assim que me alojei com os colportores estudantes, tive um treinamento básico para fazer o trabalho da colportagem. Recebi um prospecto (mostruário) dos livros: "O Grande Conflito", "O Desejado de Todas as Nações", "Vida de Jesus", "Fumar: Distrai ou Destrói?", "O Fumo no Banco dos Réus", "O Drama do Alcoolismo", "A Ilusão das Drogas" e muitos folhetos para evangelismo e várias revistas missionárias, que naquela época eram: "Revista Decisão", "Revista O Atalaia", "Revista Mocidade", "Revista Nosso Amiguinho", "Revista Vida e Saúde". Algumas dessas revistas não são mais publicadas, como é o caso das revistas "Decisão", "O Atalaia" e "Mocidade". Após essa minha primeira experiência na obra da Colportagem Evangelística, tive a oportunidade de continuar colportando desde então por mais 14 férias escolares consecutivas, e vendi muitos livros, além dos que já mencionei, vendi os seguintes títulos em especial: "O Despontar de uma Nova Era" e "Colunas do Caráter", porque esses dois livros foram escritos pelo Dr PhD Siegfried Júlio Schwantes, que alguns anos mais tarde seria meu professor de Arqueologia Bíblica no SALT/IAE. Também vendi os seguintes livros em minhas férias de colportagem estudantil: "A Cura e a Saúde Pelos Alimentos", o qual era bem pesado e dava muito trabalho na hora de entregar, "O Drama do Tabagismo", "Os Campeões São Vegetarianos", dentre outros que não me recordo no momento, sendo os que mencionei os principais. 

Na segunda-feira daquela primeira semana de colportagem, em Dezembro de 1982, eu saí juntamente com outro jovem colportor estudante pela primeira vez para colportar. Edson era um jovem de São Paulo e tinha muita experiência na colportagem, e já na primeira oferta ele vendeu um livro "O Grande Conflito" e me deu a venda de cortesia, o que me deixou muito animado. Mesmo sem ser um membro batizado da IASD eu tive a oportunidade de colportar.  Eu não sabia, mas tinha sido votado uma autorização pelos líderes da igreja e da Associação Catarinense para que eu pudesse trabalhar como colportor estudante naquelas férias, mesmo ainda sendo membro da IEQ e não da IASD. Logicamente que para vender os livros eu tive que ler e estudar cada um. E foi assim que comecei a vender literatura adventista e alguns livros de Ellen G. White com apenas 16 anos de idade e sem ser oficialmente um Adventista do Sétimo Dia. A seguir algumas revistas e livros que vendi como colportor estudante e que não são mais publicados ou que têm uma nova edição:

Revista "O Atalaia" 

Revista "Decisão"

Revista "Mocidade"

Livro Vendido nas Férias de 1982/1983
Observe que na capa desta edição antiga do livro "O Grande Conflito" há uma referência clara ao Papado Romano e ao Protestantismo, o que não vemos mais nas edições atuais.

Livro Vendido nas Férias de 1982/1983
Versão Encadernada 

Livro Vendido nas Férias de 1982/1983
Versão Brochura

Livro Vendido nas Férias de 1982/1983
Versão Brochura

O principal livro que eu vendi naquela primeira férias de colportagem foi o livro "Vida de Jesus", encadernado ou em brochura, com belas ilustrações coloridas. E esse foi o segundo livro de Ellen G. White que eu li todo. Enquanto os dias passavam eu recebia alguns estudos bíblicos e participava da rotina da equipe de colportores estudantes. Lembro que as quartas-feiras à noite, aos sábados pela manhã e aos domingos à noite todos se arrumavam com sua melhor roupa e iam para o culto na IASD central de Lages, SC. Era interessante ver a reação das pessoas na rua, ao verem um grupo de jovens bem vestidos, com roupa social ou de terno e gravata segurando a Bíblia e o Hinário Adventista do Sétimo Dia nas mãos, e indo adorar a Deus no templo junto com a igreja. Durante aquelas férias, eu frequentei apenas a Igreja Adventista do Sétimo Dia, e confesso que cheguei a esquecer da IEQ, da qual eu ainda era membro, pois eu estava tão envolvido e comprometido com aquele trabalho de evangelismo e com as atividades na IASD, que eu não tinha tempo de pensar noutras coisas. Eu estava fascinado com a obra da colportagem, pois eu podia falar de Jesus para as pessoas, vender livros que continham a mensagem do Evangelho Eterno e ainda ganhar algum dinheiro como resultado do meu empenho. Tudo isso sem nenhum custo inicial para mim, pois a editora Casa Publicadora Brasileira fornecia todo o material em consignação para acertar tudo no final da campanha de férias. Confesso que aprendi muito naqueles meses de dezembro de 1982 e janeiro e fevereiro de 1983.

Tive algumas experiências espirituais profundas enquanto estava lá com aquela equipe de jovens estudantes colportores. Fiz novas amizades e novos irmãos em Cristo que mantenho até hoje, mesmo passados todos esses anos. Mas o que mais me chamou a atenção foi o fato que desde o primeiro dia que cheguei no alojamento da equipe até o último dia que dormi lá, nenhuma noite eu fiquei sem dormir ou tive enfrentamentos espirituais como costumava ter em minha casa. Era como se Jesus e seus anjos estivessem constantemente acampados ao nosso redor, eu sentia muito a presença de Deus entre nós. Aprendi durante aquele período a importância do culto diário e do estudo diário da Bíblia por meio da Lição da Escola Sabatina. Em nenhum momento que estive entre aquele grupo eu me senti discriminado, pelo contrário, eu via a Cristo em cada um daqueles jovens, eles eram diferentes, amavam a Jesus, eram sábios na Palavra de Deus e procuravam obedecer os Mandamentos de Deus. Eu me sentia inspirado no meio deles. Eu observava todo o comportamento deles e ficava impressionado com seu cristianismo. Lembro em especial do jovem Claudio Adão, que atualmente (2019) é pastor adventista missionário na África, o qual cantava belos hinos de  louvor a Jesus com seu violão. Lembro que muitas vezes ao ouvir ele cantar e tocar, quando as luzes estavam apagadas e todos já estavam prontos para dormir, eu me emocionava e chorando orava a Jesus. Havia cultos todas as manhãs antes de iniciarmos nosso trabalho, e à noite quando todos já tinham chegado também havia um culto, a gente cantava hinos, meditava na Palavra de Deus ou em algum trecho do livro "O Colportor Evangelista", e orávamos em duplas ou em grupo. Lembro que eu sentia uma paz muito grande e me sentia livre da presença do mal. Aquelas férias foram inesquecíveis. Aquelas férias e aquela experiência na Obra do Terceiro Anjo, ou seja, na Colportagem Evangelística, marcaram minha vida cristã para sempre e causaram um profunda transformação em minha história de vida.

Em relação ao trabalho da colportagem evangelística, em meu dia a dia quando eu ia oferecer os livros ou dar uma oferta, como costumávamos dizer, sempre, antes de bater numa porta eu fazia uma oração e pedia a benção de Deus. Quando eu não vendia nenhum livro, eu oferecia uma revista evangelística, que na época era a revista "Decisão", mas também havia outras opções como revista "Mocidade", "Vida e Saúde" ou "Nosso Amiguinho". Quando eu não vendia nem uma revista eu deixava pelo menos um folheto com mensagem bíblica. Era muito gratificante fazer a obra de Deus. o Senhor me abençoou muito naquela minha primeira experiência como colportor estudante.

Os dias passaram rapidamente e logo chegou o mês de Fevereiro. Quando me convidaram para o batismo nas águas eu aleguei que já era batizado na IEQ. Contudo, após um estudo Bíblico sobre o tema, ficou claro para mim a necessidade de me batizar na IASD, uma vez que onde eu estava frequentando, na IEQ, apesar da minha sinceridade, eu estava violando o mandamento de Deus em relação ao sábado. Não foi fácil para mim tomar aquela decisão. Eu tinha muitos amigos e conhecidos na IEQ, e eu gostava da companhia deles e do convívio cristão que a IEQ proporcionava. Eu já não ia num culto lá fazia uns três meses, e eu precisava me despedir deles e explicar minha decisão. Decidi então que após meu batismo na IASD eu iria fazer minha última visita na IEQ e dar meu testemunho lá.

Desta maneira, após estar convencido das verdades contidas na Palavra de Deus, fui batizado no dia 19 de Fevereiro de 1983 na Igreja Adventista do Sétimo Dia central de Lages, SC. Lembro que após meu batismo o irmão Horácio Goulart me chamou em particular e me deu três sábios conselhos que me servem até os dias de hoje. Ele me disse: "Irmão Jorge, aqui dentro da igreja ninguém é teu exemplo ou modelo, teu único exemplo e modelo é Cristo, olhe só para Jesus. Nunca deixe de orar um único dia, pois é assim que você vai falar com Deus. E nunca deixe de ler a Bíblia um único dia, pois é assim que Deus vai falar com você!"

Minha história naquela colportagem, juntamente com a de outro jovem, o Antônio Muniz, que também colportou sem ser adventista e também se batizou comigo naquele sábado de manhã, foi registrada de maneira resumida e publicada na Revista Adventista em Maio de 1983, um periódico oficial da IASD, como pode ser constatado nos links a seguir.

Revista Adventista de Maio de 1983 - Reportagem especial: "Frutos da Colportagem", páginas 25,26.

http://acervo.revistaadventista.com.br/cpbflip.cpb?ed=1640&s=467955979  - RA/Maio/1983.







Pr Eliseu de Oliveira lendo o voto batismal para Jorge N. N. Schemes (à esquerda) ladeado por Antônio Muniz

Jorge N. N. Schemes sendo batizado nas águas pelo Pr Eliseu de Oliveira (Departamental de Colportagem da AC)

Salatiel (Líder da equipe de colportores estudantes)  entregando o certificado de batismo a Jorge N. N. Schemes

Equipe de colportores estudantes que atuou em Lages, SC, nas férias de verão em 1982/1983

Jorge N. N. Schemes - Com 16 anos de idade

Após o meu batismo nas águas aos 16 anos de idade, e com o término da campanha dos colportores estudantes, tive que enfrentar uma dura realidade. Depois que meus colegas foram embora e a maioria voltou para os Internatos Adventistas, agora como ex-membro de uma igreja pentecostal, eu era um Adventista do Sétimo Dia convicto das mensagens para este tempo do fim, mas percebi que a rotina dos cultos na IASD sem os meus amigos colportores estudantes era bem diferente. Logo me dei conta de estar frequentando cultos de oração nas quartas-feiras à noite em que havia apenas três ou quatro pessoas. Eu não entendia aquela frieza e indiferença para com os cultos de oração, pois na minha antiga igreja pentecostal esse era o principal culto, no qual se buscava fervorosamente o batismo no Espírito Santo. Sinceramente, foi um choque para mim, pois eu estava acostumado a frequentar os cultos da IEQ nos quais a igreja estava praticamente lotada, era uma igreja grande, com capacidade para cerca de 300 pessoas, só o grupo de jovens tinha mais de 100 jovens e adolescentes. De repente me vi dentro da IASD de Lages, SC, com um número bem reduzido de membros e de frequentadores dos cultos de domingo e mais reduzido ainda nos cultos de quarta-feira à noite, sendo que no sábado pela manhã a igreja estava sempre lotada. Outra coisa que senti falta foi do cumprimento dos irmãos com a paz, na IASD não tinham esse costume, e eu sentia falta de mais fervor espiritual. Então decidi que da minha parte eu não seria mais um "morno", como descrito por Jesus à igreja de Laodiceia em Apocalipse 3.

Após o fim daquela colportagem de férias e logo após meu batismo na IASD, quando tive que voltar pra a casa da minha avó, não demorou muito para que os demônios começassem a me perturbar novamente nas madrugadas. Eu sabia que minhas lutas iriam aumentar, pois agora eu estava sob uma nova luz da Palavra de Deus e do Espírito de Profecia. Antes de dormir eu lia a Bíblia e orava pedindo a proteção Divina para aquela noite. Eu sempre recitava a promessa de Deus no Salmos 4:8 que diz: "Em paz me deito e logo pego no sono, porque só tu Senhor, me fazes repousar em segurança". Outro costume que eu tinha antes de dormir era colocar uma Fita K7 do famoso conjunto adventista internacional chamado Heritage Singersem meu Aparelho de Fita K7 e Gravador de Voz, o qual ficava em cima de uma pequena mesa em meu quarto. Essa era uma das minhas únicas fitas K7 com músicas sacras de louvor e adoração cantadas harmoniosamente em inglês, a qual eu escutava deitado em minha cama em meu pequeno quarto até adormecer. As minhas músicas preferidas do Conjunto Heritage Singers eram: "Jesus, Keep Me Near The Cross"; "If That Isn't love"; "He Touched Me"; "There's Something About That Name"; "I Believe"; "Side By Side"; "Someone is Praying For You". Confesso que ao ouvir as músicas do Heritage Singers eu sentia uma paz muito grande, e muitas vezes chorava pensando no amor de Jesus por mim.

Aparelho de Fitas K7 e Gravador de Voz da Década de 1980 no qual eu ouvia Heritage Singers

Todavia, na maioria das noites quando eu acordava nas madrugadas sentindo a presença do mal em meu quarto, eu não temia mais, eu me apegava à palavra de Deus e a prática da oração da fé, geralmente após orar eu recitava o Salmo 91 em voz alta. Jesus sempre ouviu e atendeu minhas orações, sempre me protegeu, guardou e livrou dos demônios. Apesar das minhas experiências espirituais serem intensas no confronto com as forças das trevas, eu nunca contei nada para ninguém sobre o que acontecia comigo, nem mesmo na igreja, pois temia que as pessoas não entendessem e fizessem algum julgamento precipitado a meu respeito. Dessa maneira, os confrontos e ao mesmo tempo as vitórias dadas por Deus por meio do seu Filho Jesus, eram algo muito pessoal na época, que eu enfrentava de maneira solitária do ponto de vista humano, mas na presença do meu amado Jesus e seus anjos de luz.

Apesar de toda minha luta, eu estava feliz com minha nova experiência cristã. Mas eu precisava me despedir dos meus amigos e irmãos da IEQ, sendo assim, fui numa reunião de jovens num domingo à tarde na sede da IEQ de Lages, SC. Lá me deram a oportunidade de falar em público, mesmo sabendo que eu já era um membro da IASD, e pude dar minha mensagem para aqueles jovens, falando de fé e confiança em Deus. Foi minha última participação na Igreja do Evangelho Quadrangular de Lages, SC.

O tempo foi passando, e minha dedicação na IASD central de Lages, SC, era total. Recordo com saudades daqueles dias ensolarados aos sábados pela manhã, especialmente no período do inverno rigoroso da Serra Catarinense, nas quais eu acordava bem cedo, me vestia com minhas melhores roupas e calçado, sempre de terno e gravata, pegava minha Bíblia, meu Hinário e minha Lição da Escola Sabatina, e caminhava cerca de cinco quilômetros para chegar a tempo na igreja para a classe dos professores da escola sabatina, que começava pontualmente as oito da manhã. Geralmente eu costumava jejuar aos sábados pela manhã, o que me fazia muito bem. Ao lembrar daqueles momentos, posso sentir aquele clima agradável do outono e inverno lageano, o qual costuma ser muito frio, mas seco e ensolarado, e principalmente sentir o quanto Jesus foi bom e misericordioso comigo.

Devido a minha dedicação nas atividades da igreja, não demorou muito para que a liderança me convidasse para ser um professor da Escola Sabatina, responsável por uma classe de estudos da Bíblia todos os sábados pela manhã. Lembro que aceitei imediatamente, mesmo sentindo o peso daquela tremenda responsabilidade, pois eu era novo na fé adventista e ainda bem jovem. Me dediquei de corpo, alma e coração ao cargo, sempre estudava minha lição da escola sabatina todos os dias, mas na sexta-feira à noite eu costumava fazer uma revisão geral em meu pequeno quarto na casa da minha avó. Era incrível, mas toda sexta-feira de madrugada eu tinha que praticar a oração da fé para enfrentar as perturbações demoníacas que aconteciam em meu quarto para tentar me intimidar, e sempre o Senhor Jesus me ouvia, atendia e dava o livramento. Eu posso afirmar que vivi o grande conflito entre o bem e o mal na minha própria pele naqueles dias.

Gosto de lembrar a sensação de acordar aos sábados pela manhã bem cedo e me preparar para ir à igreja na classe de professores da escola sabatina que iniciava as oito horas em ponto. Eu abria meu roupeirinho de uma porta só feito de compensado, olhava minha poucas roupas e vestia minha melhor roupa para ir adorar e servir a Jesus: uma camisa branca, uma calça marrom, um blazer bege, um sapato marrom claro e uma das duas gravatas que eu tinha, era meu uniforme de sábado. Eu saia de casa bem cedo, fizesse sol ou fizesse chuva, e andava aproximadamente cinco quilômetros para chegar na igreja central de Lages a tempo de participar da classe de professores da escola sabatina, e sempre chegava com alguns minutos de antecedência. Era meu costume não comer nada aos sábados pela manhã, geralmente eu fazia um jejum até chegar em casa para o almoço.

Também não demorou muito para que a liderança da IASD de Lages, SC, me convidasse para pregar. A princípio os convites eram para os cultos de oração nas quartas-feiras á noite, das 20 horas às 21 horas. Como geralmente havia bem pouca gente nesses cultos, eu não relutei em aceitar. E foi justamente numa dessas reuniões de oração às quartas-feiras à noite que fiquei conhecendo o pastor Léo Ranzolin. Eu havia sido escalado para fazer o sermão naquela noite de inverno, e como eu não sabia muita coisa da estrutura organizacional da IASD a nível mundial, e ninguém me avisou quem era o pastor Ranzolin, eu iniciei e terminei o meu sermão tendo como ouvinte ninguém mais e ninguém menos do que o líder mundial da IASD para os Jovens Adventistas (JA) e para os Desbravadores, tendo sua sede nos Estados Unidos da América (EUA), ou seja, The General Conference of Seventh-Day Adventist Church. O pastor Ranzolin tinha vindo dos EUA/USA para visitar a família, mas também havia trazido fardos de roupas para doação às "Irmãs Dorcas" à época, hoje é a ASA (Ação Solidária Adventista). Eu tinha apenas 16 anos de idade e aquele ano era o meu primeiro ano como membro da IASD, e eu não conhecia a sua estrutura administrativa a nível mundial, eu apenas sabia que tinha uma Associação ou Missão em cada Estado e vários colégios internos, mas desconhecia a estrutura administrativa da igreja por meio das Uniões, Divisões e Conferência Geral.

Quando vi o pastor Léo Ranzolin entrando na igreja antes do início do culto naquela noite gelada de inverno, vestido com um sobretudo preto por cima do terno e acompanhado de sua mãe, a dona Itamira Ranzolin, eu não fazia ideia de que estava diante de uma família de pioneiros na fundação da IASD em Lages, SC. O pai do pastor Léo Ranzolin, o senhor Ernesto Ranzolin, e sua mãe, Itamira Ranzolin, foram pioneiros responsáveis pela organização da IASD de Lages, SC, juntamente com outras pessoas, dentre elas meu amigo e irmão na fé, Horácio Goulart. Mas eu desconhecia tudo isso, e como ninguém me alertou quem era aquele homem alto, usando óculos e trajado de preto, eu iniciei meu sermão e terminei sem lhe dar a palavra. Todavia, à saída do culto, após cumprimentar a todos e inclusive o Pr Léo Ranzolin e sua mãe Itamira, é que fui informado pelo irmão Horácio Goulart e pelo irmão Sebastião Souza de quem se tratava, mas já era tarde, a gafe já tinha sido cometida e o que me restou foi pedir desculpas ao pastor Léo pelo ocorrido. Lembro das palavras do pastor Léo Ranzolin ao me dizer que eu tinha dom para a pregação, e que deveria continuar exercendo esse dom. Fiquei impressionado com sua humildade e simplicidade. Também descobri depois que sua mãe, a dona Itamira Ranzolin era amiga da minha avó materna, Osvaldina Emy da Silva Muniz, e da minha mãe, Miriam Aparecida Neto Schemes. A irmã Itamira Ranzolin já era viúva, e me recordo que ela sempre estava presente nos cultos, ela foi uma mulher de fé que dedicou sua vida à igreja, .

Depois desse incidente marcante para mim, passados alguns meses, resolvi escrever uma carta para o pastor Léo Ranzolin nos EUA na sede da Conferência Geral da IASD. Ele era o líder mundial JA e de Desbravadores, e na carta eu me desculpei mais uma vez pelo ocorrido naquele culto de oração de quarta-feira à noite na igreja de Lages, SC. Como ele viajava pelo mundo todo e eu colecionava selos à época, lhe perguntei na carta se poderia me enviar alguns selos para me doar. Fiquei surpreso ao receber uma resposta, mais ou menos um mês depois, uma carta com envelope com as bordas em azul e vermelho e timbrado com a logo da The General Conference of Seventh-Day Adventist Church. Além das palavras de incentivo do pastor Léo Ranzolin, dentro da carta haviam vários selos de diferentes países ao redor do mundo. Lembrando que naquela época (1983) não havia Internet e muito menos celulares com aplicativos de comunicação, e a gente esperava até um mês para receber uma carta. Aquela carta não foi a única, lembro de ter me correspondido com o pastor Léo Ranzolin mais umas quatro ou cinco vezes, e em todas elas ele sempre me respondia com palavras de ânimo e incentivo. Léo Ranzolin era um verdadeiro líder e um verdadeiro pastor, e suas cartas me ajudaram muito a lutar pelo meu ideal de ser um ministro do evangelho. Infelizmente não tenho mais essas cartas para postar aqui, mas tenho a lembrança vívida dessa experiência em minha mente e coração, além da minha gratidão ao pastor Léo Ranzolin pela consideração em me responder, agradeço principalmente pelas palavras de incentivo e ânimo escritas naquelas cartas, bem como sua atenção dispensada a mim que era apenas um adolescente sonhador. 

Mais tarde, anos mais tarde, exatamente em 1988, tive o prazer e o privilégio de reencontrar o pastor Léo Ranzolin em São Paulo, SP, no campus do IAE/SALT, atual UNASP. Ele não era mais o líder mundial de jovens adventistas (JA) e Desbravadores, mas era o vice-presidente mundial da IASD na The General Conference of Seventh-Day Adventist Church nos EUA/USA. O pastor Léo Ranzolin tinha vindo ao Brasil e eu o reencontrei por acaso andando nas alamedas do internato (IAE). Quando o cumprimentei, ele não lembrava de mim, então lhe contei o que tinha ocorrido naquele culto de quarta-feira na IASD de Lages, SC, em 1983, e também lhe disse que eu estava cursando o terceiro ano de teologia. Assim que acabou de me ouvir, ele deu um sorriso e me disse admirado: é você? E me deu um abraço me desejando as bênçãos de Deus. Foi um encontro rápido, mas que para mim teve muito significado, pois eu sentia que o plano de Deus para minha vida estava se concretizando. 

Em junho de 2021 fiquei sabendo que o pastor Léo Ranzolin já estava aposentado como pastor da IASD, mas que depois disso tinha sido o presidente do IDE-GO, então, acessando o site enviei um e-mail solicitando que se fosse possível ele pudesse entrar em contato comigo, pois eu estava escrevendo sobre a sua família nesse capítulo, e para minha surpresa obtive respostas. A seguir copiei e colei a troca de e-mails entre mim e o pastor Léo Ranzolin na íntegra:

Leo Ranzolin - e-mail -  25 de jun. de 2021 15:37

sex., 25 de jun. 15:37 (há 11 dias)
para mim
Estimado amigo Pr. Jorge: Felicidades em Cristo!
Recebi sua mensagem através de IDE-GO e me alegro que conhece minha família. Meus pais Ernesto e Itamyra, já faleceram. Perdi também Elmo, Enio, Marlene, Ernestinho. Somente meus irmãos Antonio, Paulo e vosso amigo estão vivos. Estou curioso de saber o que você está escrevendo em seu livro à respeito de nossa família!

Você deve saber também que minha esposa Lucila é filha do falecido Pr. Rabelo. Completamos 65 anos de casados dia 20 de Fevereiro. Estou com 87 e ela 85. Temos 3 filhos. Dr. Léo Jr., Reitor do Depto de Religião no Loma Linda, Luis Roberto, contador e Larry Administração. Tenho 4 netos e agora um bisneto!

Maranata! O Senhor logo vem!
Pr. Léo

Jorge Schemes - e-mail - 25 de jun. de 2021 17:25

sex., 25 de jun. 17:25 (há 11 dias)
para Leo
Paz em Jesus!

Prezado pastor Léo Ranzolin, recebo seu e-mail com grande satisfação, pois a última vez que recebi uma correspondência sua por meio de carta impressa foi em 1983, e eu tinha 16 anos em Lages, SC.

Hoje estou com 54 anos de idade, tenho três filhos: Miriam (21), Gabriel (15) e Victoria (4).

Como informei fui pastor ordenado da IASD, mas fiquei no ministério apenas oito anos. Não vou relatar aqui toda minha história, pois é justamente sobre isso que estou escrevendo um e-book para dar meu testemunho sobre a graça de D'US por meio de JESUS. No meu livro faço menção a vossa pessoa como alguém que me apoiou e inspirou em minha adolescência e juventude para ser um pastor. Embora não tenha ficado na obra tenho um ministério pessoal de oração intercessora. 

O que estou escrevendo sobre você e sua família fez parte de um capítulo da minha história de vida na IASD. Sou a quarta geração de adventistas em minha família por parte de mãe. Minha avó e minha mãe, que já faleceram, eram amigas da vossa mãe Itamira, e eu também a conheci na igreja de Lages, SC. 

Com sua permissão gostaria de em outro momento lhe enviar o link do meu e-book, e também com sua permissão incluir parte de seu e-mail como informações adicionais.

Também apreciaria se pudesse me dizer como surgiu o IDE GO e qual a sua participação nesse ministério. Pois pretendo fazer menção em meu e-book.

Segue o link de um dos meus projetos de oração.

Cordialmente, em Cristo:
Jorge Schemes

Leo Ranzolin - e-mail - sex. 25 de Jun. de 2021 20:38

sex., 25 de jun. 20:38 (há 11 dias)
para mim
Prezado amigo e irmão Jorge! Feliz Sábado! O irmão queria saber a origem do IDE-GO!

Na década de 90 um irmão missionário nas Filipinas iniciou o que chamamos hoje de Gospel Outreach, usando obreiros nacionais para a Janela 10-40! Esses obreiros conhecem a língua e a cultura do povo e como resultado ganham muitas almas. Assim surgiu GO USA e Canada, com apoio da Igreja na América do Norte e também da Associação Geral. Depois de minha aposentadoria visitei a cidade de Walla Walla onde reside o primo de minha esposa - Ruben Garcia, filho do falecido Pr. Dario.

Sua esposa, Evanir, filha do falecido Pr. Josino Campos era uma das voluntárias da organização e pediu-me que traduzisse alguns materiais e entrevistas para promover GO. Fiquei encantado com o programa e formamos um grupo para iniciar IDE-GO no Brasil, em Dezembro de 2010. Fiquei como Presidente por 5 anos e desde então a liderança tem  sido de líderes que residem no Brasil, Tivemos problemas no início com as Uniões mas hoje IDE-GO está marchando com uma equipe maravilhosa liderada pela irmã Dilma Franco, assessorada pelo pelo Pr Siloé Almeida! 

Maranata! O Senhor logo vem!
Pr. Léo

Jorge Schemes - e-mail - 26 de jun. de 2021 15:17

26 de jun. de 2021 15:17 (há 10 dias)
para Leo
Paz em Jesus!

Prezado pastor Léo Ranzolin, agradeço mais uma vez sua resposta.

Quanto ao e-book e o que escrevi sobre você e seus pais, segue a seguir o link do mesmo.

Cordialmente, em Cristo.
Jorge Schemes


Além disso tudo, após o meu batismo em 1983 eu não faltava em nenhum culto da igreja de Lages, SC, e em nenhuma programação JA (Jovens Adventistas) aos sábados à tarde, ou na famosa "social" à noite, a não ser quando ia fazer trabalho missionário com o irmão Sebastião Souza. E sempre que me convidavam para participar de alguma atividade da igreja eu nunca neguei ou disse não. Mesmo no inverno rigoroso eu não faltava aos cultos, às vezes no culto de oração das quartas-feiras à noite tinha apenas eu, o irmão Horácio e o irmão Sebastião, meu pai na fé. Mesmo com tanta mornidão eu estava feliz em Jesus e nas verdades da Sua Palavra. Quando eu era pentecostal raramente lia e estudava a Bíblia, agora, como membro da IASD passei a amar, ler e estudar a Palavra de Deus diariamente e avidamente por meio do Ano Bíblico que era incentivado pela igreja a cada início de um novo ano. Guardei de lembrança meus dois guias dos primeiros anos bíblicos devidamente anotados, confira abaixo:




Sobre minha experiência com a leitura diária da Bíblia só posso dizer que foi sobrenatural, pois foi lendo a Santa Palavra de D'US que aprendi amar e servir a Jesus. Ler a Bíblia todos os dia foi como ouvir a voz de D'US falando diretamente ao meu coração. Quando fiz o meu primeiro ano Bíblico, eu tinha o costume de entrar no meu quartinho na casa simples de madeira da minha avó, orar antes de iniciar a leitura da Bíblia pedindo a iluminação do Espírito Santo e ficar ali durante horas lendo, meditando, refletindo e sublinhando com caneta ou lápis de cor os textos bíblicos que mais me impactavam. O resultado final de fazer anotações e sublinhar textos bíblicos foi que minha primeira Bíblia ficou toda colorida. Tempos depois, antes de ir estudar Teologia no IAE em 1986, dei aquela minha primeira Bíblia anotada e sublinhada para um dos meus melhores amigos de infância, o Ricardo Reich. 

No ano de 2021, passados mais de trinta anos, consegui o contato do meu amigo Ricardo e conversamos pelo WhatsApp e por vídeo chamada. Qual não foi a minha surpresa quando recebi dele em meu WhatsApp as imagens a seguir da mesma Bíblia que eu lhe havia dado de presente.





Minha Primeira Bíblia, a qual Dei de Presente ao Meu Amigo de Infância Ricardo Reich. Bíblia Totalmente Lida em Meu Primeiro ano Bíblico, Sublinhada Com Lápis de Cor e Com Anotações à Mão Feitas por Mim Quando eu Tinha 16 Anos de Idade. 

Após receber essas fotos da Bíblia, a princípio eu não lembrava do que se tratava, fiquei curioso e perguntei para o meu amigo Ricardo sobre elas e ele me respondeu o seguinte: "Oh meu caro amigo, sim rapaz, essa Bíblia foi você que me deu, muito anos atrás lembra? Essa Bíblia você leu ela inteira e tudo o que você lia nela você marcava com caneta ou lápis de cor e eu tenho ela guardada até hoje, tá guardadinha, esse foi o presente que você me deu. Eu lembro que você entrava no teu quartinho, aquele que ficava nos fundos da casa da tua avó, perto da cozinha, e ficava lá lendo essa Bíblia. Essa Bíblia me acompanhou por muito lugares, por onde eu viajei por muito tempo e ela me acompanhou também muitos anos junto com o Táxi. Eu li muitos Salmos com ela, todo dia eu lia um pedacinho quando podia, e eu sentia muita segurança, me sentia sempre apegado com D'US pedindo, e foi assim né cara, foi uma recordação de um amigo mesmo né cara, e você ter me dado ela, foi um presente, eu sempre guardei com muito carinho até hoje e tá lá guardada. Mas sempre me acompanhou em todo lugar que eu estive. Daí de uns três ou quatro anos para cá que eu guardei ela e não usei mais, porque tá muito velhinha e tá desmanchando entende, eu não queria estar para cima e para baixo, e daí eu ganhei uma Bíblia da mãe, mas só que é grande, daí eu tenho em casa. Mas tua Bíblia sempre me acompanhou, e agora tá guardadinha lá, porque acho que se aposentou né cara, muito velhinha, ela tá bem machucada né, porque vai indo com o tempo vai se descolando as folhas, então, daí eu não queria que ficasse mais estragada, por isso que eu guardei ela".

Não preciso dizer da minha surpresa e felicidade ao saber que minha primeira Bíblia, lida e sublinhada durante o meu primeiro ano bíblico, a qual tinha uma importância e um significado tão especial para mim, também passou a ter para o meu amigo de infância Ricardo Reich. A seguir mais fotos enviadas pelo meu amigo Ricardo com a Bíblia que lhe dei de presente, provavelmente em 1984 ou 1985.



Meu Amigo de Infância Ricardo Reich Manuseando a Bíblia Que Lhe Dei de Presente, Provavelmente em 1984 ou 1985, a Qual Ele guardou Por mais de 35 Anos e Tem Até os Dias de Hoje (2021).





Minha segunda Bíblia também foi lida completamente durante meu segundo ano bíblico, e também foi anotada e sublinhada. Essa Bíblia me acompanhou durante todo o tempo em que estudei no SALT/IAE/SP, e posteriormente quando trabalhei meus primeiros anos como aspirante ao Ministério Pastoral da IASD e anos após minha ordenação pastoral. Como a capa original que era preta chegou a cair de tanto eu manusear, mandei fazer uma capa nova com encadernação reforçada costurada à mão em uma gráfica quando eu ainda estava em Lages, SC. O trabalho ficou tão bem feito que ainda tenho essa Bíblia até hoje. A seguir fotos da segunda Bíblia que li completamente, anotei e sublinhei como de costume.


Capa, Contracapa e Partes da Minha Segunda Bíblia



Eu Tinha o Costume de Sublinhar as Passagens que Mais Gostava, Escrever  Textos e Orações, Além de Fazer Anotações e Comparar Textos com Textos Que Falavam do Mesmo Assunto.


Na contracapa final da minha segunda Bíblia havia uma lista de estudos bíblicos temáticos que eu havia feito comparando textos que falavam do mesmo assunto, de tal maneira que o texto bíblico inicial levava até o próximo texto e assim por diante, formando uma cadeia de textos bíblicos que falavam do mesmo tema bíblico como indica a lista de assuntos que anotei na contracapa final. 

O ano era 1983, eu era um menino de 16 anos de idade que amava servir a Jesus e sua igreja. Mas, naquele ano eu tinha que me dedicar mais aos estudos, pois eu havia sido reprovado na escola no ano anterior em duas disciplinas, assim, tive que cursar novamente o primeiro ano do Ensino Médio, mas com uma diferença crucial, eu estava decidido a nunca mais reprovar, pois eu queria ir para o IAE - Instituto Adventista de Ensino - Atual UNASP, em São Paulo, SP, estudar teologia e ser um pastor da IASD. E foi o que fiz, estudei e fiz o meu melhor nas escolas por onde estudei o Ensino Médio, ou seja: Centro Educacional Vidal Ramos Júnior, Instituto Adventista Paranaense - IAP, e Colégio Aristiliano Ramos

Apesar de toda minha dedicação na IASD naquele ano de 1983, ainda restava uma última dúvida doutrinária em minha mente, era sobre o batismo com o Espírito Santo e o "dom de línguas". Eu já havia recebido estudos sobre isso, mas a dúvida ainda persistia, desta maneira, o que fiz foi dobrar os joelhos e por mim mesmo estudar o assunto diretamente na Palavra de Deus. E foi lendo Atos 2 e I Coríntios 14 verso por verso e pedindo a iluminação do Espírito Santo em oração que entendi o verdadeiro significado do dom de línguas e do batismo com o Espírito Santo. Posso afirmar que enquanto eu era pentecostal sempre havia estudado textos separados de seu contexto, mas agora tudo estava claro sob a direção do mestre dos mestres, o Espírito Santo de Deus. Estou falando disso porque para um pentecostal a experiência de falar em línguas estranhas é muito marcante, pois significa o sinal do batismo com o Espírito Santo. Um fato curioso sobre essa questão foi que enquanto eu estava na IEQ presenciei alguns casos de pessoas que estavam falando em línguas e o pastor foi até elas e expulsou demônios. Havia a crença entre os pentecostais da IEQ de que mesmo essa manifestação podia ser falsificada pelo mal, e nem todos os que falavam em línguas estranhas tinham o aval divino, alguns casos eram possessão demoníaca. Outra crença era que haviam pessoas que falavam em línguas estranhas pela carne, ou seja, imitavam as demais, fingiam que estavam recebendo um suposto Espírito Santo, se emocionavam, pulavam, gritavam e choravam muito, mas era tudo teatro e imitação. Depois que entendi o assunto pela Palavra de Deus e iluminado pelo Espírito de Jesus, cheguei a conclusão que além desses dois fatores tinha um terceiro, o de pessoas que falavam em línguas por manipulação e indução psicológica por parte do pastor, devido ao momento extremamente frenético e emotivo do ambiente de culto, onde muitas vezes a racionalidade é praticamente deixada de lado, algumas pessoas são induzidas psicologicamente a entrar numa verdadeira "Catarse" coletiva. Sem esta última dúvida em minha mente, eu estava pronto para prosseguir com fé e atingir a meta que o Espírito de Jesus havia colocado em meu coração, ou seja, a de ser um pastor ordenado da IASD.

Todavia, não seria tão fácil assim atingir a meta de ser um pastor da Igreja Adventista do Sétimo Dia, porque minha família não tinha condições financeiras e eu era apenas um jovem estudante do Ensino Médio de família pobre. Com meu batismo nas águas e minha dedicação no serviço cristão, logo minha mãe e minha avó voltaram a frequentar a igreja e voltaram a santificar o sábado do quarto mandamento da Lei de Deus, em honra ao Deus criador e redentor. Isso foi para mim motivo de grande alegria. Mas minhas lutas espirituais com as forças das trevas continuaram em praticamente todas as madrugadas, principalmente nas sextas-feiras para amanhecer o sábado. Como já disse, eu estava focado em servir a Jesus, e logo a igreja me convidou para ser professor da escola sabatina, ao que aceitei prontamente. Também recebi convites para fazer sermões nas quartas-feiras no culto de oração e aos domingos, mas raramente aos sábados, pois eu ainda era um neófito na fé e nas doutrinas adventistas.

Meu sonho era estudar em um Internato Adventista, deste modo durante o ano de 1983 escrevi cartas para alguns colégios, ou seja, IACS, IAP e IAEatual UNASP, solicitando uma vaga como aluno bolsista industriário. Alunos bolsistas industriários na época, eram jovens sem recursos financeiros que pagavam seus estudos trabalhando dentro do Internato no contra turno das aulas. Recebi um retorno positivo de um deles, me oferecendo a oportunidade de estudar como aluno bolsista e pagar o colégio com meu trabalho no contra turno dentro do próprio colégio. Lembro que quando recebi a carta de admissão eu orei ao Senhor e tive a impressão de que não deveria ir, mas ao invés disso deveria optar pela obra da colportagem nas férias de verão que se aproximavam. E foi justamente isso que fiz, decidi que eu iria colportar mais uma vez e iria estudar com o dinheiro que eu ganhasse na colportagem como colportor estudante. 

Quando o ano estava findando, antes de acabar minhas aulas no início de dezembro de 1983, eu demonstrei interesse em colportar novamente nas férias de verão de 1983/1984. Como eu tinha contato com a Associação Catarinense da IASD por meio do departamento de publicações através o pastor Eliseu de Oliveira, o qual havia feito meu batismo, pois havia me tornado um colportor efetivo ocasional durante aquele ano de 1983, não foi difícil saber onde a mesma equipe que eu havia trabalhado pela primeira vez estaria naquelas férias. Eu tinha mantido contato com muitos daqueles jovens colportores estudantes e irmãos em Cristo por meio de cartas escritas à mão, ou no máximo datilografadas em máquinas mecânicas de datilografia. Lembrando que naquela época não existia Internet, nem computadores e muito menos celulares. A equipe era liderada pelo jovem Salatiel, e eu havia recebido um convite dele para ir para Campo Grande, MS, colportar com sua equipe.

Eu havia terminado o primeiro ano do Ensino Médio com sucesso em 1983. Naquele ano estudei no mesmo colégio em que havia reprovado no ano anterior, no Centro Educacional Vidal Ramos Júnior, e como um jovem adventista eu deixei um bom exemplo e meu testemunho lá. No início do mês de dezembro de 1983, antes de ir para a o que seria as minhas segundas férias de colportagem, eu foi convidado para participar de uma reunião promovida pelo Rotary Club de Lages, SC, por meio das Soroptimistas, para receber um prêmio em dinheiro. Foi um jantar no qual até o prefeito da cidade estava presente, na época era o Dr Paulo Duarte, o qual me entregou o prêmio como segundo colocado. Lembro que durante o jantar, que ocorreu no Clube 14 de Junho que ficava bem no centro da cidade de Lages, SC, eu sentei ao lado de uma senhora que era membro das Soroptimistas, a qual percebendo meu acanhamento na hora da refeição servida como janta, me disse cochichando ao ouvido: "não tenha vergonha meu jovem, fique bem à vontade e aproveite a comida". Nesse jantar, que ocorreu em um dos clubes mais chiques da cidade na época, eu fui com minha melhor roupa, a mesma roupa da foto que publiquei acima, quando eu tinha 16 anos. Porque foi uma reunião onde tinham pessoas importantes da sociedade lageana na época e eu queria de certa forma representar bem a IASD. Curiosamente quem tirou o primeiro lugar no concurso de redação foi uma jovem negra católica que havia estudado comigo na mesma turma no ano anterior, e que tinha me presenteado com uma caixa de lenços em um amigo secreto feito entre os colegas de sala de aula. O terceiro lugar ficou para um jovem estudante que era primo segundo meu, o qual morava perto da minha casa, e também era católico. Dessa maneira, eu não me senti totalmente sozinho e deslocado naquela reunião. Eu ganhei aquele prêmio em dinheiro porque havia participado de um concurso municipal de redação promovido pelas Soroptimistas, e havia ficado em segundo lugar. O tema da redação era sobre os Dez Mandamentos. Lembro que em meu texto usei uma citação de Ellen G. White mencionando seu nome, a qual foi sublinhada pela banca examinadora. Um livro de Ellen G. White que me ajudou muito na minha vida de estudante foi: "Conselho aos Professores, Pais e Estudantes", e foi desse livro a citação que usei em minha redação que chamou a atenção da banca examinadora, a ponto de sublinharem a frase, a qual dizia: "Um jovem sincero, consciencioso e fiel numa escola é um inestimável tesouro".

Link para o livro "Conselhos aos Professores, Pais e Estudantes" em PDF:
http://www.centrowhite.org.br/files/ebooks/egw/Conselhos%20aos%20Professores,%20Pais%20e%20Estudantes.pdf

Quando o evento de entrega dos prêmios acabou, já era quase onze horas da noite e eu voltei para casa quase correndo pela Avenida Duque de Caxias, pois justamente naquela mesma noite em que recebi aquele prêmio em dinheiro eu iria viajar, mais precisamente a meia noite. Era o início do mês de dezembro de 1983, e eu já estava com passagem de ônibus comprada para viajar para Campo Grande, MS, onde teria minha segunda experiência na obra da colportagem. O dinheiro daquele prêmio literário que eu havia ganhado, que era uma boa quantia na época, eu pedi para minha avó Osvaldina depositar na minha caderneta de poupança, onde também estava o dinheiro que eu tinha ganhado na minha primeira colportagem nas férias anteriores, pois já que minha família não poderia pagar a faculdade de teologia no SALT (Seminário Latino Americano de Teologia), no IAE (Instituto Adventista de Ensino), em São Paulo, SP, eu resolvi me preparar e guardar todo dinheiro que eu pudesse, para que quando eu fosse estudar lá eu já tivesse uma reserva. Eu estava com 16 anos, prestes a fazer 17 anos de idade no dia 16 daquele mês de dezembro de 1983.

Minha avó foi me levar até a rodoviária de Lages por volta da meia noite, horário em que meu ônibus sairia. Lembro do seu semblante preocupado e de seu pedido para escrever uma carta assim que eu chegasse lá em Campo Grande, lembrando que na época não havia celulares nem Internet e os telefones fixos custavam o preço de um carro zero, e por essa razão não tínhamos um em casa. Sobre minha avó materna tenho a dizer que ela era uma mulher de oração e eu sabia que podia contar com suas orações de fé, e que tudo daria certo. Eu disse a ela o que sempre dizia quando me perguntavam como eu iria pagar os meus estudos: "Deus proverá"! Deste modo, iniciei minha viagem de ônibus convencional pela Viação Expresso Nordeste a qual duraria aproximadamente 25 horas, com a primeira parada em Londrina, PR, onde faria uma baldeação para Campo Grande, MS. Foi uma viagem cansativa, mas cheguei ao meu destino em segurança e quando desembarquei na Rodoviária de Campo Grande eu estava por minha conta, sob a direção de Deus.

A única informação que eu tinha do local onde estava alojada a equipe de colportores estudantes era que eles estavam na Escola Adventista do Bairro Amambaí, ao lado da igreja, onde também ficava o escritório da Associação da IASD na época. Resolvi economizar algum dinheiro com táxi e peguei um ônibus até o bairro Amambaí. Já estava escuro e eu carregava uma mala de roupas e um colchão fininho enrolado e amarrado, pois durante a colportagem dormiríamos no chão de uma sala de aula. Eu também tinha dinheiro suficiente para pagar uma passagem de volta para Lages, SC, se algo desse errado. Lembro que caminhei pelas ruas do bairro e fui me informando com as pessoas sobre onde ficava a escola adventista, que era bem conhecida na região. Logo passei em frente a Associação da IASD e não demorou muito para achar o local. Me senti aliviado ao reencontrar alguns amigos e irmãos que haviam colportado comigo na minha cidade natal. Logo, o Salatiel veio conversar comigo e me dar as boas vindas. Naquela mesma noite ele definiu um campo de trabalho para mim no mapa da cidade. No dia seguinte, após o culto matinal e o lanche da manhã, eu saí para trabalhar com fé e confiança em Jesus, levando comigo alguns textos da Bíblia e do livro "O Colportor Evangelista", os quais eu lia antes de fazer uma oração e entrar em cada casa ou comércio para dar uma oferta. Peguei o meu prospecto dos livros: "A Cura e a Saúde Pelos Alimentos", "O Desejado de Todas as Nações" e "O Grande Conflito", juntamente com várias revistas e folhetos missionários e fui à luta com fé e coragem. Trabalhei aquele dia todo debaixo de um sol causticante, e por incrível que pareça, após dar em média umas 15 ofertas do material que eu estava vendendo, não consegui vender nada, nenhum pedido. Eu fiquei desanimado, e me perguntava: "O que eu estou fazendo aqui?" Ao voltar para o alojamento na escola adventista, já era noite, eu estava cansado e faminto, e pensei em voltar para minha cidade no dia seguinte. Dinheiro para passagem eu tinha. Quando cheguei no alojamento, após tomar um banho, comer alguma coisa e conversar com meus colegas, fui orar e ler o livro "O Desejado de Todas as Nações", um dos livros que eu estava vendendo junto com o livro "A Cura e Saúde Pelos Alimentos". Após passar algum tempo em comunhão com Jesus minhas forças e meu ânimo foram renovados.

No dia seguinte saí para trabalhar confiante nas promessas de Deus e comecei a ser abençoado ao vender livros e revistas missionárias. Eu dava em média 15 ofertas por dia dos livros por meio de um prospecto, o qual tinha uma parte no final para ser assinado pela pessoa que comprava, e anotava as encomendas em um bloco próprio para isso, com o pedido, o endereço e a assinatura do(a) comprador(a) para entregar em até trinta dias. Graças a Deus eu vendia bem, em média eu vendia em 12 ou 13 das 15 ofertas que eu dava, em algumas ofertas eu vendia a coleção dos três livros juntos, noutras eu vendia um dos livros separado, ou uma revista. A revista eu vendia à vista e usava o dinheiro para minha alimentação e manutenção. Quando eu não vendia nada eu deixava um folheto missionário contendo a mensagem da Segunda Vinda de Jesus. Minhas ofertas duravam em média de 30 a 45 minutos desde o primeiro contato até o fechamento da venda por meio de um pedido. Deus estava me abençoando. Eu trabalhava debaixo de sol e debaixo de chuva, aliás, em Campo Grande chovia quase todos os dias uma chuva de verão no final da tarde. Era o mês de dezembro, e meu aniversário estava chegando, no dia 16/12/1983 eu faria 17 anos de idade. Foi a primeira vez que passei meu aniversário, natal e ano novo longe da minha família. Eu escrevia cartas contando tudo o que ocorria comigo e lembro de ter escrito uma carta em especial agradecendo por tudo que minha mãe e avó faziam por mim, pois em casa eu tinha comida pronta na mesa todos os dias e roupa lavada, e agora eu tinha que me virar para comer e lavar minha própria roupa, o que eu aprendi a fazer ao custo de rasgar algumas. Como chovia uma pancada de chuva de verão todos os dias no final da tarde, às vezes eu chegava no alojamento no começo da noite e minhas roupas tinham caído do varal no chão devido ao vento e chuva fortes. Mas tudo foi um grande aprendizado para mim, amadureci muito com aquela experiência.

Um acontecimento que marcou aquela colportagem foi uma venda coletiva que fiz numa reunião do Rotary Club da cidade. Quando cheguei no local, a reunião não tinha começado. Me apresentei como estudante de Santa Catarina que estava fazendo uma campanha sobre saúde na cidade, e pedi permissão para apresentar meu material para todos os membros do Rotary na reunião. O responsável disse que sim, e me convidou para participar do jantar com eles, e me disse que após o jantar ele me daria a palavra e eu poderia falar. Fiquei nervoso, pois naquela reunião estariam os homens mais importantes da cidade, empresários, médicos, fazendeiros e profissionais liberais. Lembro que assim que começaram a chegar eu fiquei em pé num local aos fundos da sala. Lembrei das palavras de Jesus em Lucas 14:7-11: "E disse aos convidados uma parábola, reparando como escolhiam os primeiros assentos, dizendo-lhes: Quando por alguém fores convidado às bodas, não te assentes no primeiro lugar; não aconteça que esteja convidado outro mais digno do que tu; E, vindo o que te convidou a ti e a ele, te diga: Dá o lugar a este; e então, com vergonha, tenhas de tomar o derradeiro lugar. Mas, quando fores convidado, vai, e assenta-te no derradeiro lugar, para que, quando vier o que te convidou, te diga: Amigo, sobe mais para cima. Então terás honra diante dos que estiverem contigo à mesa. Porquanto qualquer que a si mesmo se exaltar será humilhado, e aquele que a si mesmo se humilhar será exaltado". E foi exatamente isso que eu fiz. Quando todos os membros do Rotary já estavam sentados, o presidente me anunciou a todos e me convidou para sentar ao seu lado ao centro da mesa. Após o jantar me foi dada a palavra e me coloquei em pé para falar. Todos me olhavam fixamente. Falei de onde eu era e do trabalho que realizava nas férias para conseguir uma bolsa de estudos em dinheiro para poder continuar estudando, falei dos meus planos futuros e mostrei os prospecto dos livros que estava vendendo. Expliquei que aqueles que tivessem interesse em participar deveriam assinar a lista de pedidos ao final do mostruário e colocar seu endereço. Logo meu mostruário estava passando de mão em mão e quase todos os presentes assinaram o pedido. Vendi naquela noite o equivalente as vendas da semana. O Senhor me abençoou ricamente. 

Outra experiência que foi marcante, ocorreu numa tarde daquelas férias. Eu bati na porta de uma casa e uma senhora veio me atender. Me apresentei como estudante e fiz toda introdução como de costume e logo ela me convidou para entrar em sua casa. Assim que entrei na sala e sentei numa poltrona confortável eu lhe pedi um copo de água, pois estava fazendo muito calor. Aquela senhora me trouxe um suco gelado muito gostoso no lugar da água, e logo começou a demonstrar preocupação por eu estar tão longe de casa, ela me disse ainda que minha mãe devia estar preocupada e me tratou como um filho. Depois que mostrei o prospecto dos livros que estava vendendo, ela me disse que não ia comprar nada, mas que me daria uma ajuda em dinheiro. Foi lá dentro e voltou com uma quantia equivalente ao valor do livro "O Desejado de Todas as Nações". Insisti em lhe trazer um livro, mas ela recusou. Agradeci muito aquela mulher, ela parecia um anjo de Deus para me animar e encorajar. No dia seguinte voltei até a sua casa, bati na porta e ela abriu. Quando me viu ficou surpresa, eu lhe disse que tinha voltado para lhe dar um presente, ela ficou curiosa, então lhe entreguei o livro "O Desejado de Todas as Nações", ao que ela simplesmente sorriu e agradeceu. Orei ao Senhor para que ela tivesse um encontro real e verdadeiro com o Filho de Deus e se aproximasse ainda mais de Jesus por meio daquele livro.

Colportei naquelas férias nos meses de dezembro de 1983, janeiro e fevereiro de 1984. A cidade de Campo Grande, MS, tem um clima muito quente nessa época do ano, e devido ao calor e ao consumo exagerado de manga, uma fruta típica daquela região, fiquei com uma alergia ao redor da boca e nas orelhas. Mas Deus me abençoou e um médico que eu havia vendido alguns livros me deu uma consulta gratuita e me orientou sobre o que fazer para resolver o problema. Aquelas férias passaram muito rápido e logo chegou o seu final e o período de realizar as entregas das encomendas feitas. Como eu tinha vendido bem e tinha muitas entregas para fazer, comprei uma mochila tipo do exercito com armação de ferro para entregar os livros, que ficavam bem pesados numa mochila cheia, pois só um deles já era bem grosso: "A Cura e Saúde Pelos Alimentos". Foi levando muito peso nas costas, debaixo de sol e chuva, que fiz as entregas dos pedidos, sempre falhava uma média de 10% dos pedidos, o que era normal devido a vários fatores. Mas naquelas férias eu consegui o estipêndio, ou seja, eu ganhei dinheiro suficiente para estudar num Internato Adventista por um semestre como aluno regular, ou seja, eu apenas dedicaria meu tempo aos estudos, lazer, esporte e atividades espirituais oferecidas pelo colégio. Após o acerto final na Associação, decidi que eu iria estudar no IAP (Instituto Adventista Paranaense) que fica no interior da cidade de Maringá, no Estado do Paraná. No início de março de 1984 fui de ônibus de Campo Grande para Maringá, e assim que cheguei no IAP me matriculei como aluno regular no segundo ano do Ensino Médio, no curso de Técnico em Saúde Pública, e paguei o semestre letivo à vista em dinheiro, que havia ganhado com o trabalho da colportagem nas férias. Foi uma experiência marcante para mim, porque eu estava conquistando minha autonomia e realizando um sonho.

Estudei no IAP os meses de março e abril de 1984. Naquela época o colégio interno não era tão moderno como hoje, e suas instalações eram relativamente simples. Mas era um lugar muito agradável e bem cuidado. Assim que me instalei no dormitório, escrevi uma carta para minha mãe e para minha avó dizendo que eu estava no Instituto Adventista Paranaense e que não voltaria para casa naquele ano, pois iria estudar o Ensino Médio lá, talvez fosse visitá-las nas férias de julho antes de sair para a colportagem. Em abril de 1984 tive uma grande surpresa, minha avó chegou no colégio trazendo algumas roupas novas, um terno novo e um par de sapatos novos. Eu sabia que tudo tinha sido comprado com muito sacrifício, mas fiquei super agradecido e feliz com a visita dela. Ela passou um final de semana comigo. nunca vou esquecer. Ela estava feliz por mim e ao mesmo tempo triste por eu ter saído de casa tão novo e tão cedo. Lembro que quando me despedi dela e quando a vi partindo num final de tarde de domingo, fiquei olhando ela ir ir embora de ônibus e senti meu coração apertar no meu peito, eu chorei. Naquele mesmo instante decidi que ainda não era hora de deixar minha família, naquele mesmo instante decidi que eu voltaria para minha casa e continuaria meus estudos na minha cidade, e que eu só sairia de casa depois que terminasse o Ensino Médio e fosse fazer teologia no SALT/IAE, São Paulo, SP, pois essa era minha principal meta. Desse modo, naquela semana ainda me despedi dos colegas e amigos que havia feito ali, fiz um acerto com o setor financeiro do colégio, paguei pelos dias estudados e recebi o restante do meu dinheiro de volta em espécie. No domingo seguinte quem estava deixando o colégio e voltando para casa era eu.

Recordo que coloquei meu dinheiro, em espécie, embaixo do meu pé por dentro da meia, com medo de perdê-lo ou ser assaltado. Afinal, Jesus mesmo disse: "Sede simples como as pombas, mas prudentes como as serpentes". Eu precisaria daquele dinheiro no futuro para estudar Teologia. De Maringá peguei um ônibus para a rodoviária de Apucarana, no Paraná. Dali fui com um ônibus direto para a minha cidade natal. Após chegar na rodoviária de Lages, SC, peguei um táxi até minha casa. Lembro da surpresa de todos quando me viram. Minha mãe e avó perguntaram se eu tinha vindo passear, ao que respondi: "não, eu voltei para ficar, só vou sair de casa quando tiver que ir para a cidade de São Paulo cursar Teologia". Elas ficaram muito felizes, e minha mãe me confidenciou que minha avó, que eu considerava minha segunda mãe, estava muito triste e meio deprimida com minha saída de casa. Concluí que foi bom eu ter voltado. Um fato interessante durante os meses que eu estive fora de casa, foi o fato de que eu não sofri nenhum enfrentamento com as forças malignas, mas ao chegar em minha casa, todo aquele confronto espiritual começou a acontecer nas madrugadas. Conclui que o problema poderia estar com o local ou alguém da família. Mais tarde descobri que minha mãe estava lendo o livro "O Evangelho Segundo o Espiritismo" de Allan Kardec, o qual eu queimei posteriormente.

Desta maneira, lá estava eu novamente na cidade de Lages, SC. Procurei uma escola para continuar estudando e a única escola pública que consegui matrícula foi no Colégio Estadual Aristiliano Ramos, que na época ficava no calçadão, no centro da cidade, e que atualmente já foi demolido. Eu queria fazer o curso de Técnico em Enfermagem, mas não tinha mais vagas. Então me matriculei no curso de Auxiliar de Farmácia, eu queria estudar na área da saúde no Ensino Médio, naquela época era ofertada uma educação profissionalizante, a gente fazia o "propedêutico" no primeiro ano, com as disciplinas básicas do Ensino Médio, e no segundo e no terceiro ano fazia o curso profissionalizante. Era o ano de 1984 e logo chegaram as férias de julho, que naquela época duravam quase dois meses. Logicamente fui colportar mais uma vez. Desta vez fui para a cidade de Criciúma, e trabalhei em Içara, SC, uma cidadezinha próxima. Na realidade a equipe de estudantes ficava alojada em uma casa alugada em Criciúma, sob a liderança do jovem Tércio Reginaldo Teixeira Marques, o qual se tornou um grande amigo e alguns anos mais tarde foi meu contemporâneo no curso de Teologia no IAE, e atua até hoje como Pastor Departamental de Publicações da IASD. O que mais me recordo dessas férias eram dos cultos matinais principalmente, nos quais a gente cantava a todo fôlego vários hinos de louvor, mas a letra da canção oficial para encerrar o culto e iniciar o trabalho da colportagem me marcou bastante, ela dizia: "embora a luta seja grande, e seja grande o temporal, nós não podemos ter derrotas, mas precisamos vencer o mal, com Jesus Cristo à nossa frente, o nosso mestre general, nós venceremos, nós venceremos, nós venceremos afinal"! Lembro também que o Tércio Marques, como gostava de ser chamado, sempre dizia: "não deixem o gigante ficar nas costas de vocês", se referindo a preguiça ou enrolação no trabalho. O dinheiro que ganhei naquela colportagem também coloquei na minha caderneta de poupança, pois meu objetivo era cursar teologia após concluir meu Ensino Médio. 

Durante o período em que fiz o Ensino Médio em Lages, SC, guardei todo o dinheiro que ganhei nas colportagens, de maneira que quando eu fui estudar em São Paulo eu já tinha dinheiro para pagar um ano do SALT/IAE só com os juros, sem precisar mexer no saldo. E Enquanto eu estuda lá, quase sempre ganhei o estipêndio nas férias, com exceção de uma única vez. Mas Deus sempre proveu o necessário. Resumindo, desde meu batismo até o final do Ensino Médio entre 1982 a 1986 e durante toda faculdade do curso de teologia que fiz entre 1986 a 1989, eu colportei como colportor estudante todas as férias de final de ano e todas as férias de julho em várias cidades, somando um total de 14 períodos de férias, tais como segue a seguir:

1 - Dezembro de 1982 a Janeiro e Fevereiro de 1983 - Lages, SC.
2 - Julho de 1983 - Florianópolis, SC.
3 - Dezembro de 1983 a Janeiro e Fevereiro de 1984 - Campo Grande, MS.
4 - Julho de 1984 - Criciúma (Içara), SC.
5 - Dezembro de 1984 a Janeiro e Fevereiro de 1985 - Chapecó (Xaxim), SC.
6 - Julho de 1985 - Lages, SC.
7 - Dezembro de 1985 a Janeiro e Fevereiro de 1986 - Florianópolis, SC.
8 - Julho de 1986 - Brusque, SC.
9 - Dezembro de 1986 a Janeiro e Fevereiro de 1987 - Blumenau (Timbó), SC.
10 - Julho de 1987 - Santo Ângelo, RS.
11 - Dezembro de 1987 a Janeiro e Fevereiro de 1988 - São Miguel do Oeste, SC.
12 - Julho de 1988 - Florianópolis, SC.
13 - Dezembro de 1988 a Janeiro e Fevereiro de 1989 - Florianópolis, SC.
14 - Julho de 1989 - Erechim, RS.

Quando eu estava para começar o terceiro ano do Ensino Médio, eu estava colportando naquelas férias na cidade de Chapecó, SC, na equipe do Tércio Reginaldo Teixeira Marques, grande amigo até hoje, era o verão de 1984/1985. Eu havia me alistado no 1º Batalhão Ferroviário de Lages, pois estava com 18 anos de idade. Fui convocado para comparecer no Exército em plenas férias de janeiro, bem no meio do meu trabalho de colportagem. Após um dia dentro do batalhão fazendo testes e passando por avaliações juntamente com diversos jovens, fui encaminhado por um oficial para a última etapa do processo seletivo, uma entrevista com um Tenente. Ele me perguntou se eu queria servir a pátria, eu lhe respondi que sim, mas que eu não poderia servir, porque estava trabalhando nas férias para juntar dinheiro para fazer a faculdade de teologia da IASD. Lhe expliquei que eu era Adventista do Sétimo Dia e que pretendia estudar para ser um pastor. Também lhe mostrei meu bloco de pedidos, as encomendas de livros que já havia feito em Chapecó, SC, e que eu precisaria retornar para fazer a entrega. Ele apenas me ouviu atentamente. Eu estava apreensivo com a possibilidade de ficar engajado no batalhão, mas eu havia orado e colocado nas mãos de Deus, para que se fosse da vontade dEle eu pudesse ser dispensado, retornasse para a colportagem e pudesse concluir o Ensino Médio naquele ano de 1985. Um fato preocupante era o de que meu curso profissionalizante não abriria mais turmas, assim, se eu servisse o batalhão eu atrasaria meus estudos no Ensino Médio em três anos, pois teria que fazer o segundo ano novamente após ficar um ano servindo o exército. Se isso ocorresse, meu sonho de ir para o SALT/IAE só seria possível em 1988. Após a entrevista com o Tenente, ele me encaminhou para a fila dos que iam cortar o cabelo para receber o uniforme e ficar engajados no batalhão. Eu apenas orava e esperava uma resposta do Senhor, eu tinha plena certeza que a vontade de Deus seria feita, independente da vontade ou da autoridade dos homens. Quando eu estava quase chegando para que cortassem meu cabelo em estilo milico, um sargento gritou o meu nome: Jorge Nazareno Neto Schemes! Levantei a mão e me identifiquei. Ao que ele me disse: "Você está liberado, passe na junta militar semana que vem para pegar a tua terceira!" (Carteira de Reservista de quem é dispensado do serviço militar). Eu sai do batalhão naquele dia dando graças a Deus e mais decidido ainda em colportar e me preparar para estudar teologia no SALT/IAE.


Equipe de Colportores Estudantes Sob a Liderança de Tércio Reginaldo Marques na cidade de Chapecó/SC - Férias de Verão de 1984/1985 - Da esquerda para a direita (fila de trás), os que lembro o nome: 5º Gérson Arruda; 7º Dario Sebulsky; 8º Luiz Carlos Sprotte. (fila da frente): Tércio Reginaldo Marques; 3º (eu) Jorge Schemes.

Um fato que ocorreu enquanto eu fazia o Ensino Médio em Lages, SC, no Colégio Estadual Aristiliano Ramos foi que todos os meus colegas de sala de aula fizeram um curso bíblico que eu levei, e no final do mesmo foi feito uma cerimônia de entrega de certificados na igreja central de Lages, com o pastor Belmiro de Moraes. Deixei meu testemunho entre meus colegas, por palavras e ações, a ponto de alguns deles pedirem licença para mim quando queriam fumar, ou saiam da sala ou pediam para eu me retirar. Lembro do Rômulo, um jovem colega viciado em drogas que um dia veio conversar comigo e disse: "olha Jorge, eu admiro a tua fé, eu queria ter essa fé que você tem". Eu falei de Jesus para ele. Outro fato foi o testemunho que deixei entre os professores, que sabiam da minha fé e me respeitavam muito. No terceiro ano, dei de presente para a direção da escola um lindo quadro da Santa Lei de Deus, o qual tinha uma imagem de Jesus segurando as duas tábuas da Lei. Escrevi uma dedicatória atrás e a direção da escola decidiu pendurar o quadro na secretaria da escola, de forma que ficou visível a todos que chegavam ali.

Minha dedicação na IASD ia além das atividades promovidas pela igreja como cultos, escola sabatina, programas JA (Jovens Adventistas), cursos, vigílias e atividades missionárias, como distribuição de folhetos por exemplo. Logicamente, acabei sendo convidado pelo pastor Belmiro de Moraes para fazer um curso de Evangelismo para Missionários Leigos, oferecido pelo Departamento das Atividades Missionárias da IASD. O curso ocorreu no mês de março de 1985 no CATRE (Centro Adventista de Treinamento), o qual ficava localizado na beira mar, na praia de Itapema, SC, cujas instalações naquela época eram bem modestas, diferente de hoje. Foi assim que ganhei meu segundo certificado concedido pela IASD, o qual guardo até hoje.


Minha dedicação na igreja não era apenas aos finais de semana nas programações do sábado e nos cultos de domingo à noite e quarta-feira à noite, mas também durante a semana eu fazia trabalho missionário, dando estudos bíblicos nas casas de interessados, em algumas noites junto com o irmão Sebastião Souza, e sempre no sábado à tarde e à noite também. Nós fazíamos uma dupla missionária bem interessante. Eu sempre lembrava da relação entre o apóstolo Paulo e Timóteo quando eu saia para dar estudos bíblicos junto com o irmão Sebastião, a quem sempre considerei como um pai na fé. Lembro de um dos interessados em particular, seu nome era Jair Tadeu Machado. Jair era um jovem sargento do exército do 1º Batalhão Ferroviário de Lages, SC. Também era um líder entre a juventude da Igreja Católica Apostólica Romana da qual fazia parte. 

Essa história na verdade começou com José Rides Machado, que era o irmão mais velho do Jair, pois Rides já havia se tornado Adventista do Sétimo Dia e abandonado o Catolicismo Romano, por influência de uma vizinha que era membro da IASD. Um fato curioso sobre José Rides Machado é que ele, assim como eu, também havia frequentado a mesma IEQ de Lages, SC, e no mesmo período em que o pastor da Igreja do Evangelho Quadrangular era o Pr Pedro Antipas. Em conversa com meu amigo e irmão na fé Jair Tadeu Machado, o mesmo me contou a seguinte história sobre seu irmão José: Enquanto ele frequentava a IEQ em busca das verdades bíblicas, certa vez o pastor Pedro Antipas fez uma campanha de arrecadação de fundos para a construção do novo telhado para o prédio da igreja. Porém, após ter arrecadado o dinheiro necessário com a campanha, Pedro Antipas convidou o Dr Paulo Duarte, que era um político candidato a prefeito, para falar em um dos cultos de domingo à noite. E após a fala do Dr Paulo Duarte, claramente e sem nenhum constrangimento, o Pr Pedro Antipas pediu que os membros votassem no Dr Paulo Duarte para prefeito, o qual posteriormente acabou ganhando as eleições municipais e foi prefeito em Lages, SC. Antipas também afirmou que o Dr Paulo Duarte tinha doado todo o valor necessário para fazer o telhado novo para a igreja, mas nunca deu satisfação do dinheiro arrecadado na campanha para esse fim. Esse acontecimento deixou José Rides Machado muito insatisfeito com a atitude do Pr Pedro Antipas, e também muito decepcionado com a IEQ, o que foi suficiente para levá-lo de volta à ICAR (Igreja Católica Apostólica Romana), até ele se tornar membro da IASD como já relatei. Quando Jair me contou esse episódio, eu imediatamente lembrei desse acontecimento, pois eu também estava no culto da IEQ naquele domingo à noite, e eu também não gostei da atitude do Pr Pedro Antipas e fiquei decepcionado com a IEQ por misturar política com religião. Sendo assim, apesar de não lembrar de o ter conhecido pessoalmente, José Rides Machado e eu fomos contemporâneos durante um período na IEQ de Lages, SC, e posteriormente nós dois nos tornamos membros da IASD, cada um com sua história particular e experiência própria.

Dessa maneira, após se tornar um Adventista do Sétimo Dia, José Rides Machado solicitou ao irmão Sebastião Souza que desse estudos bíblicos para seu irmão Jair Tadeu Machado. Quando conversamos pelas primeiras vezes com o jovem Jair, logo após nossos encontros, eu e o irmão Sebastião conversávamos e tínhamos dúvidas sobre se ele estaria disposto a deixar tudo para abraçar a verdade presente do Evangelho Eterno. Como eu era um dos líderes do Clube de Desbravadores da igreja, o qual estávamos iniciando, eu convidei o jovem sargento Jair para me ajudar na liderança, o qual aceitou prontamente. Quando nos reuníamos com o Clube de Desbravadores aos domingos pela manhã no salão que ficava nos fundos da igreja central de Lages, SC, o jovem sargento Jair era o instrutor de ordem unida do Clube de Desbravadores Araucária. Além disso, o pastor Belmiro de Moraes, o qual era distrital em Lages, SC, levou alguns jovens da igreja para um curso de liderança de desbravadores no CATRE (Centro Adventista de Treinamento) de Itapema, SC, em maio de 1985. Recordo que fizemos uma vaquinha para pagar a participação do então sargento do exército Jair Tadeu Machado naquele curso. Viajamos de Kombi da cidade de Lages no planalto catarinense para a praia de Itapema no litoral de Santa Catarina, onde ficavam as instalações do CATRE naquela época. O curso foi excelente, e com certeza deve ter influenciado e contribuído bastante o Jair em sua decisão final para o batismo nas águas. Por fazer aquele curso ganhei um certificado que me habilitava a fazer parte da diretoria do Clube de Desbravadores, na realidade foi meu terceiro certificado dado pela IASD, sendo o primeiro o do meu batismo nas águas. 


Resumindo o resultado desse evangelismo particular ao sargento do exército, feito especialmente pelo irmão Sebastião Souza, foi que Jair Tadeu Machado tomou a decisão pelo seu batismo nas águas na Igreja Adventista do Sétimo Dia de Lages, SC. Posteriormente, como consequência da sua decisão, sua mãe Alzira Pereira Machado também se batizou. Mas não parou por aí, pois seu irmão Luiz Tomaz Machado, juntamente com suas irmãs: Neide de Fátima Machado, Ana Pereira Machado, Alminda Pereira Machado, Iolanda Pereira Machado e Naira Pereira Machado também acabaram se batizando na IASD. E a influência dessa história toda é que atualmente, na IASD da cidade de Urupema, SC, cerca de 90% dos membros são parentes da família do Jair Tadeu Machado. É assim que o Espírito Santo age e trabalha! Glória a Deus em nome de Jesus!

Entretanto, não demorou muito para que o jovem sargento começasse a sofrer perseguições dentro do exército por causa de sua fé. Jair foi um jovem leal e fiel ao seu chamado, mesmo sendo preso no batalhão por se recusar a trabalhar no sábado, ele continuou fiel. Quantas vezes ficamos horas e horas conversando até tarde da noite e orando juntos dentro daquele Fiat 147 azul que ele tinha, chamado carinhosamente de "caixinha de fósforo". Nasceu assim uma grande e sincera amizade. Todavia, com o passar do tempo, a situação ficou insustentável para o Sargento Jair dentro do batalhão, e ele optou por pedir sua baixa do exército. Um fato que ele mesmo me relatou certa vez, foi de uma das vezes em que ele foi preso dentro do batalhão por se recusar a trabalhar no sábado. Naquele sábado, enquanto estava na cadeia, ele resolveu ler o Salmo 119 ajoelhado dentro da cela, e quando não tinha chegado nem na metade ele já não aguentava mais de dor nos joelhos, mas permaneceu ajoelhado até o versículo 176. Outro fato ocorrido após o batismo do Sargento Jair, foi a conversão de sua mãe, irmã e irmão e o batismo dos mesmos na IASD. Resumindo a história desse valoroso jovem cristão, alguns anos mais tarde fomos contemporâneos no teológico, e Jair hoje em dia é pastor ordenado da IASD em Santa Catarina. Quando eu estava no segundo ano de Teologia, Jair chegou no SALT/IAE para começar a faculdade, e se formou um ano depois de mim. Também tive o privilégio de colportar com ele em algumas férias enquanto éramos estudantes no IAE, e uma dessas vezes foi  na cidade de Timbó, SC, onde fizemos uma dupla de colportagem. 

Nesse período em que eu frequentei a igreja adventista da minha cidade natal como membro batizado, ou seja, nos anos de 1983 a 1985, outros jovens decidiram que também iriam colportar para ir estudar Teologia no SALT/IAE e servirem a IASD como pastores. Não tenho certeza se de alguma maneira eles foram impactados e inspirados pela minha história, e pelo testemunho que dei sobre a obra da colportagem, mas eu fui o precursor de uma leva de futuros líderes da igreja que saíram da minha cidade natal. O fato é que além do jovem católico e sargento do exército, Jair Tadeu Machado, seu irmão Luiz também colportou e estudou Teologia, e hoje também é pastor distrital da IASD. O jovem Paulo Pinheiro, que além de colportar várias férias se formou em Teologia e atualmente é Departamental de Publicações da IASD. Outro jovem foi o Ocimar Pinheiro, que colportou várias férias e chegou a iniciar Teologia no IAE, mas não concluiu. Esses jovens foram meus irmãos em Cristo e grandes amigos em Lages, SC, lembro que antes de eu ir para o SALT/IAE nós fazíamos serenatas nas casas dos membros da igreja e vigílias de oração na sala que ficava nos fundos da IASD em Lages, SC. Saudades daquela época, a gente era feliz e não sabia. Aquele ano de 1985 passou voando, e fui abençoado também em meus estudos no curso profissionalizante de Farmácia, ao concluir com sucesso o Ensino Médio no Colégio Estadual Aristiliano Ramos, em pleno Regime Militar.



Frente e Verso do Meu Diploma de conclusão do Ensino Médio Articulado Com o Curso Profissionalizante de Auxiliar de Farmácia em 1985

Quando terminei o Ensino Médio no mês de dezembro do ano de 1985, fui colportar em Florianópolis, SC. Externei para minha mãe Miriam e minha avó Osvaldina, que em Janeiro de 1986 eu iria fazer o vestibular para Teologia no SALT/IAE em São Paulo, SP, e elas me disseram o que eu já sabia: "Filho, não temos condições financeiras para pagar a faculdade e o colégio interno para você!" Minha resposta para elas sempre foi a mesma: "Deus proverá!" Antes de sair para viajar para mais uma colportagem, nos ajoelhamos na pequena sala da casa de madeira da minha avó e fizemos uma oração pedindo a benção de Deus sobre meu trabalho como colportor estudante. Aquelas férias de final de ano (Dezembro de 1985 a Janeiro e Fevereiro de 1986) foram muito especiais, pois Deus me abençoou muito, não só na colportagem, mas nos dois vestibulares que fiz no IAE em São Paulo, SP, um para Pedagogia e o outro para Teologia, nos quais eu passei com boa colocação. Fiz dois vestibulares porque podíamos escolher dois cursos de nosso interesse, e como disse, passei nos dois. Deixo registrado aqui a minha gratidão ao jovem colportor Joel, que trabalhou na mesma equipe de colportores naquelas férias em Florianópolis, SC. Como ele tinha sido criado por pais adotivos que ainda eram funcionários do IAE e moravam dentro do campus do colégio, fez questão de escrever uma carta para seus pais solicitando que eu pudesse me hospedar na casa deles enquanto estivesse lá fazendo o vestibular. Fui muito bem recebido por aquele casal de irmãos já idosos, os quais me hospedaram num quarto confortável que ficava no sótão da casinha onde viviam e me ofereceram o que tinham de melhor nas suas refeições. Além de não me cobrarem absolutamente nada, dali onde eu estava até o local das provas do vestibular dava 10 minutos a pé. O final de semana que estive com eles foi uma benção, pois eles eram adventistas fiéis nos cultos domésticos, tanto pela manhã, quando cantavam hinos de louvor do Hinário Adventista, liam a Lição da Escola Sabatina e oravam, como faziam à noite, quando cantavam hinos e oravam antes de irem dormir.

Após ter sido abençoado nos vestibulares no antigo IAE, atual UNASP, voltei para a colportagem e conclui meu trabalho em Florianópolis, SC. Aquelas férias tinham sido muito especiais, pois tive várias experiências marcantes, todavia vou relatar apenas uma delas. Lembro de uma oferta que fui dar no Corpo de Bombeiros de Florianópolis, localizado na rua Visconde de Ouro Preto no centro da capital catarinense. Assim que cheguei na guarnição pedi para falar com o comandante, e prontamente me conduziram até ele. Após cumprimentá-lo e explicar o motivo da minha visita o mesmo me convidou para entrar em sua sala e me ofereceu uma cadeira para sentar bem à frente da sua mesa. Como de costume peguei meu prospecto dos livros que estava vendendo e comecei a explicar o conteúdo de cada um deles com segurança, sempre mantendo o contato visual. Notei que o comandante ficava me encarando e olhando fixamente para mim como se estivesse tentando perceber alguma incoerência da minha parte. Ao final da oferta o comandante me disse que iria comprar os meus livros por uma razão, ele afirmou que eu tinha sido verdadeiro em tudo que eu tinha dito, pois em nenhum momento eu desviei o olhar dele como se estivesse querendo esconder algo. Ele me disse que pessoas honestas e sinceras conversam olhando nos olhos, o que é difícil de encontrar hoje em dia.

Deus me abençoou de tal maneira naquelas férias de colportagem que cheguei a ser o vice-campeão em vendas da equipe de colportores estudantes, e ganhei de presente do líder da equipe um livro com uma dedicatória escrita por ele, o livro era: "O Colportor de Êxito". Ao término daquela colportagem fiz o acerto final na Associação Catarinense da IASD, localizada na rua Gisela, 900, em São José, SC. Imediatamente, após receber o dinheiro que havia ganhado com a venda de livros, voltei para Lages, SC, com o estipêndio do primeiro semestre garantido, e quando comuniquei minha família que eu havia passado no vestibular e iria estudar Teologia no IAE, minhas duas mães ficaram muito felizes. Era o início de março de 1986, e as aulas já iriam iniciar na Faculdade de Teologia. De sorte que não fiquei muitos dias em casa, logo fiz minha mala com poucas roupas e roupas de cama e viajei para São Paulo, SP, para iniciar a tão sonhada Faculdade de Teologia da Igreja Adventista do Sétimo Dia no SALT/IAE, atual UNASP. Eu havia feito a minha parte desde cedo, havia trabalhado honestamente e fielmente na obra da colportagem estudantil por várias férias, na verdade até aquele momento um total sete férias, incluindo as férias de julho, desde a época em que eu havia colportado a primeira vez sem sem membro batizado da IASD.  Eu também havia economizado o dinheiro ganho nas colportagens e confiado que Deus proveria, e assim ocorreu, Deus proveu mais do que o necessário.

Enquanto eu descansava alguns dias em casa antes de ir estudar teologia em São Paulo no IAE, ocorreu um fato que marcou minha vida. Eu tinha 18 anos de idade e estava na casa da minha avó materna quando escutei batidas na porta da sala. Ao abrir a porta vi um homem mais baixinho do que eu, que tinha praticamente a minha cara. Logo percebi que se tratava de meu pai, Volni Adelmo Schemes. Ele estava embriagado e logo foi perguntando para mim: "você sabe quem sou eu?" Eu estava atônito e permaneci em silêncio sem saber o que dizer. Novamente ele me perguntou: "você sabe quem sou eu?" Em pensamento eu já havia dado a resposta para mim mesmo, afinal, era a segunda vez que eu tinha um contato com ele, sendo a primeira quando eu tinha cinco anos de idade. Lembro bem daquela primeira vez que o vi quando eu era criança e eu fui sentar no seu colo dentro de um ônibus. Eu estava com minha mãe-avó Osvaldina e ela me disse: "olha, aquele homem lá é seu pai. Vá sentar no colo dele!". Na minha inocência infantil eu fui, e meu pai ficou imóvel, com os braços parados e virou seu rosto para a janela do ônibus me ignorando totalmente. Fiquei sem graça e corri de volta para o colo da minha avó. E agora, passados 13 anos desde aquele fato, ele estava ali diante de mim novamente e embriagado, me  perguntando se eu sabia quem ele era. Diante do meu silêncio, ele não perguntou novamente, e foi respondendo enquanto caia em prantos e me abraçava: "eu sou teu pai", "teu pai", "não vai me dar um abraço?". Após ele me abraçar chorando muito, convidei-o para entrar e sentar. Ali ficamos como dois estranhos. Ele perguntou sobre minha mãe e minha avó, falou um pouco do passado, procurou achar culpados, e me perguntou se eu estava estudando. Eu lhe respondi que havia passado no vestibular e que iria estudar Teologia em São Paulo no colégio adventista, lhe disse que eu iria ser um pastor da IASD. Prontamente ele foi contra. Disse que eu não iria não. Eu não lhe respondi, fiquei em silêncio, eu não precisava provar nada para ele. Eu sabia que a reação dele era inspirada pelo mal que o dominava naquele momento. Ignorei o que ele disse. Como não havia mais clima para diálogo ele se despediu e disse que voltaria no outro dia. De fato, no outro dia ele novamente apareceu, mas dessa vez sem estar embriagado. Conversamos um pouco juntamente com minha mãe e avó, e logo meu pai me convidou para sair com ele. Era um fim de tarde. Ele me levou num bar. Pediu  dois copos e uma cerveja. Encheu o copo dele. Quando foi encher o meu, eu coloquei a mão em cima da boca do copo e lhe disse categoricamente que eu não bebia bebidas alcoólicas. Meu pai, a quem eu estava vendo pela terceira e última vez na minha vida, me olhou fixamente e me questionou: "você não é homem?". Eu lhe respondi que eu era mais homem do que ele poderia imaginar. Após o incidente, ao se despedir definitivamente de mim, ele me colocou na mão uma nota equivalente ao valor de um dólar, e disse que era para eu comprar uns doces. Essa ficou sendo a única "ajuda" que recebi de meu pai em toda minha vida. Aquele abraço do segundo encontro quando ele estava bêbado ficou sendo o único abraço que recebi dele. Palavras de apoio e incentivo? Nenhuma, pelo contrário. Mas eu não desanimei do meu sonho, mantive sempre os olhos fixos em Jesus, o autor e consumador da minha fé, aquele que me ama, me libertou dos meus pecados e não se envergonha de me chamar de irmão diante do meu Pai Celestial.

Finalmente o dia de viajar para começar uma nova etapa na minha vida chegou. Mas antes desse dia, eu me despedi dos vizinhos e amigos da rua onde morava e dos irmãos da igreja, especialmente do irmão Sebastião Souza e do irmão Horácio Goulart, porém a despedida dos meus familiares foi um momento muito difícil para mim. Após uma oração, entre lágrimas, beijos e abraços, me despedi de todos, mas de maneira especial da minha mãe Miriam, da minha avó materna Osvaldina, conhecida como dona "Didi", e do meu irmãozinho André, chamado carinhosamente de "Dedé". Embora eu soubesse que ainda poderia visitá-los depois da minha partida, eu sabia que nunca mais voltaria para morar com eles. Dali em diante, eu acreditava que iria construir uma trajetória na história da minha vida, na qual eu seria o principal ator e autor, com a iluminação e direção do Espírito de Jesus. Recordo que antes de viajar, minha avó e minha mãe me deram várias recomendações e conselhos, dentre eles destaco as seguintes palavras ditas pela minha avó e pela minha mãe: "Filho, quando chegar lá em São Paulo nos escreva uma carta para sabermos se está tudo bem. Filho, se cuide por lá. Filho, se alimente bem. Filho, se precisar de alguma coisa nos escreva. Filho, estaremos aqui orando por você". Ao ouvir elas falarem eu via e sentia a dor da saudade nos olhos lacrimejantes das minhas duas mães. Minha mãe Miriam me disse o seguinte: "Filho, quando você nasceu nós te levamos na Igreja Adventista do Sétimo Dia para ser apresentado a Deus numa cerimônia de apresentação de crianças, e eu disse para o Senhor Jesus que você seria um servo de D'US, consagrado a Ele. E agora você está indo estudar para ser um pastor, e nós estamos muito felizes e gratas a D'US por isso". Minha avó Osvaldina, que era costureira, me ensinou na prática a pregar um botão numa camisa, a costurar uma bainha de calça, a passar uma camisa e uma calça social e a dobrar corretamente uma calça social com friso. Lembro do dia em que ela me chamou e disse: "olha meu filho, uma calça social a gente guarda assim, pega pelas pontas da bainha, coloca costura com costura, dobra e pendura no cabide pra não amassar". Ela me disse que eu iria precisar saber fazer essas coisas para não ficar pagando uma costureira sempre que fosse preciso, e ela tinha toda razão. Até hoje sei fazer essas coisas e me ajudam bastante. Minha mãe Miriam sabia fazer diferentes tipos de bordados, e também fazia blusas de tricô e toalhas de crochê, e ela tinha feito para mim um colete e um cachecol de lã, feito de tricô, o qual usei muito enquanto estudei no IAE durante os quatro anos da faculdade de teologia. Eu tenho até hoje esse colete e esse cachecol guardados, e sempre que sinto saudades da minha mãe eu pego eles nas mãos. Dizem que deixamos nossa energia e nossos sentimentos naquilo que tocamos e fazemos, e todas as vezes que pego esse colete e esse cachecol eu posso sentir em cada ponto de tricô feito por ela, com tanta paciência, muito amor e carinho da minha mãe por mim.

  Colete e cachecol de lã feito de tricô pela minha mãe Miriam Aparecida Neto Schemes em 1986

Quando fui para São Paulo, SP, de Lages, SC, viajei doze horas de ônibus, e quando cheguei lá tudo era novo para mim. Andar de metrô foi o que mais me impressionou na cidade. Assim que cheguei no colégio já fui na tesouraria pagar o semestre à vista, sempre paguei cada semestre à vista como aluno regular, com dinheiro ganho na colportagem de férias. Graças a Deus nunca fiquei devendo nada para o colégio durante os quatro anos que estudei lá. O início do curso de Teologia foi marcante. Tive a oportunidade de estudar com ótimos colegas, os quais mantenho contato até hoje por meio de um grupo que criamos da nossa turma no WhatsApp, a turma de 1989, que foi o ano da nossa formatura. Logo percebi que a Faculdade de Teologia não seria nada fácil. Os professores eram muito exigentes. Haviam monografias a fazer para cada disciplina no semestre, além disso, relatórios semanais de leituras eram exigidos em número de páginas. Muita leitura mesmo. Além de tudo isso, haviam os trabalhos e provas que eram sem consulta, no estilo tradicional, exigindo boa memorização. Mas eu estava focado e super entusiasmado, eu queria aprender tudo que eu pudesse, e no contra turno das aulas que eram dadas no período da manhã, eu mergulhava em estudos e leituras na imensa biblioteca do colégio que atendia as diferentes faculdades oferecidas no Campus Universitário, ou seja: Teologia, Enfermagem e Pedagogia. Lembro que logo numa das noites que cheguei no IAE, eu fiz uma oração de agradecimento a Deus e chorei de emoção, por ter o privilégio de estudar ali. Posso afirmar que minha experiência naquele colégio interno fizeram parte dos quatro melhores anos da minha juventude. Era o início do ano de 1986 e eu estava com 19 anos de idade.

Jorge N. N. Schemes na alameda principal do antigo IAE/SP em 1986
Aos fundos, vista do dormitório masculino, e à direita, o prédio da linda igreja do Campus Universitário

A rotina no colégio era a mesma quase todos os dias. Culto matinal na capela as 6:30 horas, "café" (cevada) da manhã no refeitório as 7:00 horas, aulas pela manhã das 7:30 às 11:30 horas, almoço vegetariano no refeitório das 1:330 às 13:00horas, tardes de estudo na biblioteca com pesquisa em muitos livros, lembrando que na época não tinha Internet nem celular. Ao final da tarde jantar vegetariano no refeitório das 18:00 às 19:00 horas, culto noturno na capela das 19:00 às 19:30 horas, horário de dormir no dormitório sob a supervisão do preceptor, professor e pastor Domício era às 22:00 horas, quando literalmente as luzes se apagavam. A rotina era quebrada na sexta-feira à tarde, quando os alunos preparavam as roupas e arrumavam o quarto do dormitório para o culto de pôr do sol na igreja do colégio na sexta-feira à noite. Eu estava feliz e agradecido a Deus por tudo que estava ocorrendo. Um detalhe importante foi o fato de que desde o primeiro dia que cheguei no IAE, até o mês de maio do ano de 1989, e depois até o mês de setembro do ano de 2015, as forças do mal nunca mais voltaram a me atormentar, eu sentia a proteção e a paz de Deus em minha vida, eu estava liberto pelo sangue de Jesus meu Salvador e Senhor. Nos próximos capítulos explico o porquê citei essas duas datas, maio de 1989 e setembro de 2015.

CONFIRA TAMBÉM: